sábado, 10 de novembro de 2007

(fev/98)
AS FIGURAS BÍBLICAS DO DIABO E DOS
DEMÔNIOS EM FACE DA CULTURA MODERNA
Juan A. Ruiz de Gopegui, SJ
(Perspectiva Teológica, ano XXIX, setembro/dezembro 1997, p. 327-352)

Traduzir ou ensinar a interpretar?


Para transmitir a Revelação da vitória de Cristo sobre todos os poderes do mal, o Novo Testamento utiliza, entre outras, as figuras de Satanás, do Diabo e dos demônios ou espíritos maus ou impuros, que, na época de Cristo, faziam parte do horizonte cultural comum a todos os povos. O objeto da fé cristã é a vitória do Salvador sobre o mal em todas as suas manifestações. Para o ouvinte ou leitor do Evangelho do nosso tempo pode surgir a pergunta: até que ponto aquelas representações bíblicas das forças do mal fazem parte da revelação ou são apenas o revestimento cultural de uma determinada época, que deve ser transposto numa nova linguagem.

Na teologia dos anos que seguiram ao Concílio Vaticano II, a figura de Satanás não ocupa um lugar de destaque. Explica-se o conjunto da fé cristã sem mencionar o nome do Diabo. Consultando o índice analítico de temas de duas importantes obras sobre o conteúdo da fé cristã — Curso fundamental da fé: Introdução ao conceito de cristianismo, de K. Rahner1 e O novo livro da fé: a fé cristã comum, de J. Feiner e L. Vischer2 pode se verificar que o nome do diabo ou satanás aparece apenas uma ou duas vezes, e quase de passagem. Ele é substituído no conjunto da obra pelo termo genérico de "mal".

Na obra de catequese fundamental, de mais de setecentas páginas, dirigida por B. Chenu e F. C. Coudreau, La foi des catholiques, Satanás é mencionado só uma vez neste breve texto: "A adesão a Cristo é o que faz soltar a presa ao maligno, cujo reinado não pode ser mais do que provisional. A vida cristã é vitória do amor de Cristo sobre todas as forças do mal e da mentira. Satanás já está vencido. Doravante não tem mais poder, além daquele que lhe concedamos. Por conseguinte, o cristão não pode afundar no desespero nem recorrer a práticas mágicas para ver-se livre do mal. Seu Senhor triunfou sobre todas as potências malignas. A vida venceu a morte. As trevas não puderam resistir diante da Luz. A fé, confiada na força libertadora de Deus, faz retroceder todo medo e toda angústia"3.

Os próprios textos do Vaticano II são também bastante parcos na explicitação das figuras bíblicas do diabo ou dos demônios. Mencionam-nos, preferentemente, sob a denominação de Maligno, apenas de forma esporádica.

Por outro lado, estas atitudes teológicas perante a figura do diabo tem antecedentes na própria Escritura. Na carta aos Romanos, que, como afirma Kertelge4, pode ser considerada como a suma da sua pregação, Paulo fala continuamente do Pecado (43 vezes) para referir-se ao poder do mal, enquanto uma só vez se refere a Satanás, no fim da carta, em Rm 16,20, onde se afirma que "em breve, o Deus da paz esmagará Satanás sob os vossos pés", afirmando, numa perspectiva escatológica, servindo-se da simbólica judaico-apocalíptica, o triunfo de Cristo sobre as divisões e os escândalos provocados por alguns membros da comunidade.

É óbvio, por um lado, que se pode falar da vitória de Cristo sobre o mal sem referir-se apenas às figuras bíblicas do Diabo ou dos demônios. Mas, por outro lado, não se deve esquecer que a renovação bíblico-litúrgica pôs a Bíblia nas mãos de todos e introduziu a proclamação em língua vernácula dos textos evangélicos, nos quais a figura do Diabo e dos endemoninhados aparecem com freqüência. Cabe, pois, perguntar se a simples substituição, na teologia e na catequese, dos diversos nomes do Diabo pela palavra Mal é suficiente para levar a uma correta compreensão da fé.

É sintomático e preocupante o ressurgimento recente de um interesse não muito sadio pelos demônios e até de certas práticas exorcísticas, originadas de uma interpretação fundamentalista dos textos bíblicos, não somente nas seitas, mas inclusive em certos grupos católicos. Nota-se também nos meios de comunicação um "secreto fascínio"5 pela divulgação de fenômenos que manifestam um mundo mágico, mítico ou preternatural.

Resulta daqui a urgência de uma catequese sobre os textos bíblicos que falam do Diabo, para que o povo cristão aprenda a interpretá-los corretamente no horizonte cultural moderno. Numa magistral conferência sobre o tema, na reunião de exorcistas diocesanos de Paris, o teólogo jesuíta René Marlé6, com a sabedoria nascida de uma longa vida a serviço da escuta e da explicação da Palavra divina, advertia que o cristão deve acolher, junto com o conteúdo da fé, a linguagem multiforme em que esse conteúdo é transmitido nos textos bíblicos e na qual somos convidados a continuar falando da revelação. Isto quer dizer que os símbolos bíblicos da expressão de nossa fé não podem ser abandonados. Devem, portanto, ser interpretados, para serem compreendidos corretamente no horizonte cultural de cada época.

Concluindo: não basta traduzir os símbolos bíblicos numa linguagem moderna. É preciso aprender a interpretá-los, porque a própria liturgia, com uma sabedoria de séculos, sempre se expressou e continuará a expressar-se na linguagem bíblica. De outra forma ela teria perdido o contato com a fonte da revelação divina e perdido toda possibilidade de vigilância crítica sobre a expressão da fé, que necessariamente sofre as influências dos cambiantes horizontes culturais no caminhar da história.

A própria Bíblia, como repetia constantemente o saudoso teólogo Juan Luis Segundo, segue esta metodologia: com suas freqüentes releituras da mensagem, mais do que ensinar-nos conteúdos fixos, nos ensina a aprender: aprender a reconhecer e a confessar a Palavra eterna e imutável nas circunstâncias mutáveis da história.


Um preâmbulo necessário: o símbolo e o conceito


Antes de entrar na análise da simbologia bíblica sobre os poderes do mal, torna-se necessária, para pessoas acostumadas à linguagem técnica e científica, uma observação sobre a linguagem simbólica.

Se a Bíblia falasse do mal apenas do ponto de vista sociológico, físico, ou psíquico, não precisaria recorrer à linguagem simbólica. Mas o mal de que fala a Bíblia, é o mal que atinge na sua raiz a obra da Criação, o mal que perverte as obras de Deus. Para falar de Deus e de todas as realidades relacionadas com o divino, não é possível falar a não ser de forma metafórica. A revelação de Deus é necessariamente simbólica porque, dada a transcendência divina, nenhuma realidade criada pode significar diretamente o Criador. É preciso recorrer a estruturas de significação que designem, junto com o sentido direto e imediato, apreendido da percepção das realidades terrenas, um sentido indireto, figurado, analógico.

Entendemos por símbolo, com Ricoeur, "toda estrutura de significação em que um sentido direto, primário, literal designa por acréscimo um outro sentido indireto, secundário, figurado, que não pode ser apreendido a não ser através do primeiro"7. O símbolo, assim entendido, se distingue do simples sinal ou da mera função significativa de toda linguagem ou expressão. O símbolo é um sinal aberto a sentidos escondidos, mais plenos, que é preciso interpretar. As características essenciais do símbolo são: dupla intencionalidade, caráter analógico, dimensão desveladora ou epifânica (o campo do símbolo é o não-visível: o inconsciente, o metafísico, o sobrenatural, o experiencial), função mediadora ou relacional e eficácia presencializadora. É por isso que a linguagem simbólica, dada a sua função mediadora e relacional, é a linguagem por excelência da comunicação "pessoal" e, portanto, da linguagem da Revelação ou auto-comunicação divina. "Tratar os vocábulos como símbolos é interessar-se prioritariamente não pelo enunciado e o seu valor, mas pela enunciação e o sujeito que nele se comunica com outro sujeito. Diz-se "alguma coisa sobre alguma coisa", como em toda linguagem, mas a atenção está voltada ao ato de "alguém que diz essa coisa para alguém"8.

Simbólico, portanto, não equivale, como às vezes se pensa, a irreal. Ao contrário, a linguagem simbólica pode expressar o real de forma muito mais densa do que a linguagem abstrata, além de poder expressar aquilo que transcende o visível e a aparência imediata. Definir o mal, em linguagem abstrata, como "carência do bem devido" — definição filosoficamente corretíssima, embora insuficiente para dar razão cabal da sua presença devastadora no mundo — abstrai das formas concretas em que o mal se manifesta. Com tal definição justificam-se facilmente sofismas, tão próprios da ideologia burguesa, como dizer que ser bom ou mau depende completa e unicamente de nossas opções livres. "Quem é mau — diz-se — é porque quer" ou "quem não sai da miséria é porque não trabalha". Diga-se isso ao menino que nasceu numa favela e que, por força das perversas circunstâncias que envolveram sua infância, viu-se obrigado a abandonar o lar e morar na rua! Ou aos que vêem definhar suas vidas em desumanos acampamentos de refugiados!

A linguagem simbólica sobre o mal, ao contrário, junta todas as experiências do mal, num símbolo (sym-ballein, em grego, significa "pôr junto") e, ainda por cima, trata de exprimir a profundidade abissal do mal, quando é relacionado com o mistério insondável de Deus. Em termos sociológicos podemos falar do problema do mal e até do absurdo do mal. Em termos teológicos, que é a perspectiva bíblica, é preciso falar do mistério da iniqüidade, mysterium iniquitatis9. Isto só poder ser feito de forma simbólica e com recurso a inúmeros e variados símbolos. Os símbolos dependem do horizonte cultural de cada época.


Os símbolos bíblicos do mal


Os símbolos bíblicos do mal são polimorfos, e não são simplesmente intercambiáveis, porque cada um deles tem uma função específica na expressão de uma realidade que transcende cada uma de suas expressões contingentes e parciais. Nas primeiras páginas da Bíblia, encontramos a serpente, que não é identificada com o diabo, nem apresentada como uma máscara de Satanás10.

Num determinado momento da história bíblica, aparecerá a figura de Satã, que sofrerá consideráveis evoluções semânticas no decorrer da história do povo de Deus. A Bíblia grega traduzirá o termo por Satã ou Satanás, simples transliteração do hebraico, ou por Diabo.

Após o cativeiro da Babilônia, entrarão no mundo cultural do judaísmo uma constelação enorme de demônios. João falará, além do Diabo, do Príncipe deste mundo, do Pai da mentira. Paulo preferirá falar do Pecado, como figura personalizada do mal. O Apocalipse porá em primeiro plano a figura do Dragão. Essas figuras não são simplesmente sinônimos. E a sua função específica nos relatos ou nos textos em que intervêm deve ser respeitada.

De forma muito concisa apresentaremos, aqui, apenas os símbolos ou figuras de Satã, ou o Diabo e os demônios.

Satã: O termo hebraico significa inimigo, adversário, sedutor. Em alguns textos da Bíblia é usado para referir-se aos inimigos militares ou guerreiros de Israel. No livro de Jó, aparece entre "os filhos de Deus". Não é ainda uma figura perversa. Apenas uma espécie de promotor de justiça ou acusador que, com licença de Deus, "tenta" ou põe à prova Jó para que possa aparecer sua fidelidade nas desgraças terríveis a que é submetido pelos azares do destino. Evidentemente estamos no terreno figurado. O livro de Jó é um Midrash, uma história fictícia ou narração figurada, para discutir teologicamente o mistério do mal e da providência divina.

Na concepção do antigo Israel, quem tenta ou induz ao mal, é o próprio Javé. Mais tarde, cria-se a personagem de Satã para tirar de Deus esta função odiosa. Em 2Sm 24,1, é atribuída a Deus a mesma ação que a releitura do mesmo episódio, no primeiro livro das Crônicas (21,1), atribui a Satã (ao Diabo, na tradução grega).

Na concepção popular, a imagem de Satã como instrumento da cólera divina passa a segundo plano e vai tomando corpo a imagem de um ser perverso, inimigo de Deus.

Diabo: Tradução grega de Satã. Significa, como o original hebraico, o Inimigo, o Caluniador, o Sedutor.

Demônios: A palavra daimonion designa no mundo antigo, conforme a crença popular, deuses ou semi-deuses que, com seu poder sobre-humano imprevisível e não raramente pernicioso e ameaçador, influem no destino dos homens. A magia tenta controlar estes poderes.

Na Babilônia, o povo judeu teve contato com a desenvolvida demonologia da Mesopotâmia. Mas as severas proibições da magia na Lei de Moisés impediram que tais crenças penetrassem nos escritos bíblicos, embora, de alguma forma, cheguem a influenciar-lhes a linguagem. Deve-se ter muito cuidado, porém, ao interpretar os textos em que a linguagem possa refletir de alguma forma as crenças dos povos vizinhos.

O termo demônio aparece, no Antigo Testamento grego, apenas 19 vezes. Sete delas no livro de Tobias, cujo gênero literário é o da historiografia criativa, ou seja, uma narração fictícia ou "estória" edificante que visa transmitir uma mensagem religiosa. Trata-se do demônio Asmodeo, que, apaixonado por Sara, vai matando sucessivamente seus sete maridos nas sucessivas noites de núpcias; até que Tobias, protegido pelo anjo Rafael, supera o malefício.

Em outras seis passagens, o termo designa os ídolos. Em outras três ocasiões, refere-se a habitantes quase-míticos do deserto. Por fim, no Salmo 91(90) v. 6, o termo "demônio" designa uma praga. Não se trata portanto de um ser pessoal, embora a terminologia possa refletir de alguma forma as crenças da Mesopotâmia. É importante notar que o termo daimonion é do gênero neutro.

Mas esta vigilância dos escritores bíblicos para evitar a contaminação com as crenças dos povos pagãos não impediu que no judaísmo tardio se estendesse entre o povo a atribuição de certas doenças, as de caráter psíquico ou neurológico principalmente, a forças maléficas que são designadas com o nome de demônios (por ser o termo grego do gênero neutro, melhor traduziríamos forças demoníacas) ou também de espíritos impuros. O qual não tem nada de estranho, no quadro dos conhecimentos médicos da época. Nos evangelhos, enfermidades como a lepra ou a paralisia, cujas causas ou sintomas são externos, nunca são atribuídas a demônios. Mas doenças "internas", de causas desconhecidas para a medicina, sobretudo quando seus sintomas se apresentam de forma intermitente, são concebidas como sendo causadas por um demônio ou uma força demoníaca. Suponhamos o caso do epiléptico: ele aparentemente não tem nenhuma doença, mas de repente é jogado no chão, por uma força desconhecida, começa a espumejar saliva, ranger os dentes até ficar rígido; diz-se que tem um demônio. Com maior motivo tirava-se esta conclusão no caso de esquizofrenia.

A designação dos demônios como espíritos impuros deve-se a que as doenças por eles causadas faziam com que o endemoninhado contraísse "impureza legal" e conseqüentemente fosse afastado da plena participação nos atos litúrgicos ou nas assembléias das sinagogas. Isto vai dar um sentido messiânico muito claro aos exorcismos e às curas de Jesus.

Também doenças como a surdez, a mudez ou a gagueira são atribuídas a demônios ou espíritos impuros. Um surdo e mudo aparentemente tem os órgãos da fala e da audição normais e contudo não ouve, não fala ou fala de forma balbuciante. Pensa-se que tem uma força estranha e desconhecida que o impede de falar: essa força é denominada "demônio mudo". Diz-se então que a pessoa está endemoninhada ou tem um demônio. Lembre-se que demônio é do gênero neutro11.

Por contaminação semântica o sentido do termo se amplia. Quando uma pessoa tem uma conduta que não se encaixa nos parâmetros socialmente estabelecidos (no caso da sociedade judaica os parâmetros da interpretação da Lei por parte dos dirigentes) diz-se que tem um demônio ou um espírito impuro. Talvez hoje diriam: perdeu o juízo! ou está doido! Foi dito de João Batista e de Jesus (Mt 11,18; Mc 3,30; Jo 8,52).

Concluindo podemos dizer que a Bíblia admite a existência de forças ou poderes que se opõem ao Reino de Deus e ao bem-estar do homem. Nem o AT nem o NT apresentam uma concepção unitária de tais poderes, representados por figuras e crenças populares diversificadas. O conjunto dessas figuras — podemos afirmar com Kertelge — se bem nos permite reconhecer traços pessoais nas manifestações dos poderes que se opõem a Deus, não chega a constituir-se numa figura "que justifique o conceito de um ser pessoal". "Tal impressão é confirmada pelo fato de que tanto no Antigo como no Novo Testamento se observam tendências não irrelevantes, que não apresentam o mal como um poder que agiria de forma anônima, mas antes o individualizam no comportamento do homem e o designam como pecado"12.


A integração deste quadro cultural com a fé no Deus criador


Diante deste horizonte cultural em que o ser humano é concebido como submetido a influências de poderes obscuros, bem sejam forças demoníacas que causam doenças ou condutas estranhas, ou induzido ao mal por algum ser misterioso, imaginado de forma personalizada como "inimigo" ou satã, a fé de Israel viu-se na obrigação de pensar a relação destas forças com o domínio absoluto de Deus sobre a criação e com a responsabilidade humana perante o Deus da aliança.

O relato do Paraíso, em que se narra simbolicamente o pecado da humanidade, tem como finalidade primeira responsabilizar o homem e mulher por terem sucumbido à tentação, representada pela figura da serpente, imagem do fascínio e, ao mesmo tempo, do caráter traiçoeiro e enganador de toda tentação. Esta é a figura também da proposta de "ser como deuses", ou de adquirir o poder da decisão arbitrária e egoísta sobre o bem e o mal. No relato, a figura da serpente nada tem a ver com a figura posterior do diabo.

A personalização do mal em Satã e a sua crescente compreensão como força que se opõe a Deus levam os autores dos livros apócrifos do período intertestamentário a urdir uma estória curiosa, que tenta conciliar a unicidade do poder do Criador de Javé com a presença no mundo de uma força que se opõe a Deus. Em polêmica com o dualismo dos povos vizinhos, Satã é imaginado como um anjo criado por Deus que, fazendo mau uso da sua liberdade, se pervertera. Surge assim nos escritos extrabíblicos a estória da expulsão de Satanás da glória celeste por não ter querido adorar Adão, feito à imagem de Deus13.

Esta estória (midrash haggádico ou interpretação narrativa dos escritos bíblicos) visa, em primeiro lugar, mostrar a grandeza do homem e da mulher, criados à imagem de Deus e, ao mesmo tempo, explicar a sua queda ou a sua situação de conflito no mundo, ameaçados pela tentação e pela desgraça. Seu objetivo não é definir a natureza de Satanás ou dos anjos, mas exaltar a grandeza do ser humano, criado à imagem de Deus, e portanto capaz de suscitar a inveja até dos seres celestes.

Em todo caso, a Bíblia nunca fez sua esta interpretação, que ligeiramente cristianizada passou a fazer parte da interpretação cristã das figuras bíblicas do mal, na época patrística. Na interpretação dos Padres, a revolta do Anjo mau não teria sido recusar-se a adorar a imagem de Deus em Adão, mas a Palavra de Deus feito carne em Jesus Cristo.

Por uma exegese equivocada e arbitrária de alguns textos bíblicos, Is 14,12 e Jó 41,10, os Padres começam a designar o Anjo decaído como Lúcifer. O texto de Isaías "como vieste a cair do céu, luzeiro da manhã, filho da aurora! Foste derrubado por terra, tu que subjugavas as nações" se refere à queda do rei da Babilônia, embora com o recurso de um poema que alude aos mitos das quedas dos deuses rivais. As imagens literárias com que é descrito o monstro marinho Leviatan ou Sinuoso, devorador do sol, nada tem a ver com a lenda da queda dos anjos14. É possível que contribua também para esta interpretação dos Padres o fato de que já o Midrash judaico falava de Satanás como "anjo resplandecente" e Paulo, aludindo provavelmente a essas tradições, afirme em 2Cor 11,14, que o tentador se disfarça de anjo da luz (angelon photon).

Às vezes se cita Lc 10,18, "Eu via Satanás cair do céu como relâmpago", como alusão a tal interpretação. Mas a afirmação de Jesus não é mais do que uma forma figurada de falar do sucesso da missão dos discípulos e sua vitória sobre os poderes que se opõem ao reino, simbolizadas pela figura de Satanás.

Tampouco pode-se citar para justificar a adoção, pela Bíblia, do midrash extrabíblico sobre a queda dos anjos, Jd 6 e 2Pe 2,4, que provavelmente depende de Judas. Ambos os textos, advertem contra falsos doutores que tentam desviar os fiéis da sã doutrina com teorias que desconhecemos, provavelmente do tipo gnóstico. O que está em questão no texto é uma chamada ao temor da justiça de Deus, e para isso se citam exemplos bíblicos, de caráter lendário, do castigo de Deus, como o dilúvio, Sodoma e o castigo dos anjos (ou filhos de Deus, que abandonaram sua posição seduzindo mulheres) de que se fala no enigmático texto do Gn 6,4, lido através de comentários de livros apócrifos, como Henoc. Evidentemente essas alusões vagas e imprecisas devem ser consideradas apenas como influência e contaminação cultural da linguagem, numa época — o judaísmo tardio — em que pululavam inúmeras especulações apocalípticas, estranhas ao cerne da mensagem cristã. Na tradição testemunhada neste texto do Gênesis aparece uma explicação origem dos "anjos maus" bem diferente da apresentada pelo midrash da Vida de Adão e Eva, que evidentemente nunca a Igreja pensou em adotar.


Jesus, o exorcista


Os evangelhos relatam diversas curas milagrosas realizadas por Jesus15. Entre as doenças curadas figuram também aquelas que no seu tempo eram atribuídas a demônios. E certamente Jesus realizou estas últimas através de exorcismos, como era comum na época. Podemos nos perguntar: Jesus, Filho de Deus, não sabia que tais pessoas eram apenas doentes mentais ou portadoras de distúrbios neurológicos? Os caminhos de resposta a esta pergunta devem ser procurados nos antigos Concílios que dirimiram as controvérsias cristológicas.

A natureza humana de Jesus, embora esteja unida substancialmente ao Verbo ou Palavra eterna de Deus, de forma alguma se mistura ou se confunde com a natureza divina. Conseqüentemente a sua inteligência e o seu saber não se misturam com a inteligência divina, única e indivisível do Pai, do Verbo e do Espírito. Deus, que certamente podia infundir certos conhecimentos proféticos na inteligência humana de Jesus, necessários para a sua missão, não teria razão nenhuma para infundir os conhecimentos atuais da ciência médica e psiquiátrica. Ao contrário, a verdade da encarnação mostra a suma conveniência de impedir qualquer ação extraordinária de Deus, no saber humano de Jesus, que o arrancasse da condição humana, igual à nossa em tudo, menos no pecado. Faz parte desta condição que a inteligência esteja inserida no horizonte cultural da época. Jesus certamente se apresentou como um exorcista, figura relevante no mundo religioso da época, e isto certamente tem uma significação teológica que vai além do fato de ter manifestado poder de curar certas doenças psíquicas. Significa que Jesus vêm "exorcizar" todas as forças que, ao se oporem à santidade de Deus, destroem ou desfiguram a vida humana.

À pergunta subseqüente de saber se Jesus concebia os demônios como forças pessoais ou apenas como forças impessoais que perturbam a vida humana, não é tão fácil responder. Provavelmente, no tempo de Jesus, existia a tendência, entre o povo, de conceber essas forças como subordinadas a poderes pessoais e, em último termo, ao Príncipe dos demônios: Satanás. Na controvérsia com Jesus, os escribas vindos de Jerusalém à Galiléia para acusá-lo de expulsar os demônios por poderes mágicos, dizem que ele expulsa os demônios pelo poder de Belzebu, "o senhor das moradas", estranhamente identificado com o príncipe dos demônios. Por trás da acusação, está provavelmente a crença popular de um exército de demônios ou poderes demoníacos comandado por Satanás. Belzebu poderia ser um dos príncipes dos demônios.

A resposta de Jesus faz suspeitar nele uma mentalidade um pouco diferente. Como é dito já no prólogo do evangelho de Marcos, no relato do confronto com o tentador, no deserto, há dois poderes em luta: o poder ou Espírito de Deus, em nome do qual Jesus expulsa os demônios, e as forças que se opõem ao Reino de Deus, simbolizadas pelo poder de Satã. Jesus argumenta que se ele agisse por um poder demoníaco, Satã estaria contra si mesmo, e o seu domínio estaria no fim. A argumentação de Jesus obviamente situa-se no contexto da mentalidade dos seus acusadores, que atribuem a poderes mágicos ou feiticeiros o seu domínio sobre as forças demoníacas. Nem Jesus nem a Bíblia fazem sua esta crença popular refletida na acusação dos adversários. A argumentação de Jesus quer apenas mostrar que suas curas e exorcismos mostram o poder do Espírito de Deus vencendo Satanás.

Os relatos dos exorcismos não nos podem trazer maiores esclarecimentos sobre a mentalidade do exorcista Jesus, porque eles não são meras reportagens dos fatos, mas estão "teologizados" através dos diálogos16 dos "demônios" com o exorcista, apresentados como porta-vozes dos poderes que se opõem ao Reino de Deus com Jesus, instaurador do Reino. Tais poderes são "simbolizados" pela figura de Satanás ou do Diabo. Dessa forma os relatos se tornam paradigmas da vitória definitiva de Jesus sobre os poderes do anti-reino, que, como sabiamente afirma Kertelge17, não pode ser pensado — quando se leva a sério a mensagem do NT sobre a vitória de Jesus sobre o mal e se interpreta corretamente os reflexos do horizonte cultural da época — como um "reino de Satanás", concebido como um exército ordenado de demônios sob o comando do Diabo. Tal forma de pensar estaria muito próxima de uma concepção dualística do mundo.

Há razões sérias para afirmar que o "pensar teológico" de Jesus diante dos poderes que, ao opor-se ao Reino, acabam sendo para ele próprio uma ameaça mortal — mesmo permanecendo no âmbito cultural da época quanto à etiologia das doenças "demoníacas" — tenha caminhado para uma lucidez progressiva quanto à identificação da raiz profunda do mal. Ela está, no dizer do Mestre, "no coração do homem", porque o que "torna o homem impuro é o mal que sai do seu interior" (cf. Mc 7,23). Não há aí um caminho precioso para identificar o simbolismo profundo da expulsão dos "espíritos impuros" e tentar penetrar um pouco no mistério insondável da consciência humana de Jesus? Porque certamente Jesus não viu nos pobres epilépticos ou endemoninhados, dos quais expulsava os demônios, uma ameaça ao Reino. Sentiu esta ameaça certamente naqueles que os tinham excluído da convivência religiosa e social e que, por inveja, chamavam de Belzebu, senhor das moradas, a quem os acolhia e abria as portas a essa convivência (cf. Mt 10,25). Ironizavam sua pretensão de ser o "dono da casa", porque os curava no sábado.

Os relatos de caráter midráshico das tentações de Jesus por Satanás no começo dos evangelhos sinópticos, mais desenvolvidos em Lucas e em Mateus, longe de contradizer a afirmação anterior a confirmam. Porque esses relatos figurados se referem ao combate de Jesus com as forças que se opõem ao seu messianismo e que, por sua vez, o submetem à prova tentando-o desviar dos caminhos de Deus, e é fácil identificar ao longo do relato evangélico quais foram essas forças no caminhar concreto de Jesus. Certamente não foram forças extramundanas que crucificaram o Messias.

No final do relato das tentações Lucas afirma. "Tendo esgotada toda tentação possível, o diabo afastou-se dele até o momento fixado." Lucas não apresenta nenhum outro ataque do diabo. Estas palavras só podem referir-se à paixão. A "prova" decisiva do Messias. Mas segundo os evangelhos os atores desta prova são todos seres humanos. Os relatos da paixão não falam nunca do diabo18.

Outro conceito utilizado por Jesus para referir-se aos poderes que se opõem ao Reino, e que inicia já nos evangelhos um processo de desmitização com relação as crenças populares de forças extramundanas, é o conceito de escândalo. Melhor diríamos a figura. Pois se trata de uma figura e bem expressiva: escândalo é a pedra que faz tropeçar e cair. Nos sinóticos encontramos 24 referências a esta figura. A sua análise mostra que todos os obstáculos que se opõem ao reino e impedem de entrar nele são "humanos"19. O maior escândalo será a cruz, mas é ela que vai tirar todos os outros.


Os azares e o sentido de uma interpretação


Como víamos, a interpretação extrabíblica do demônio dada pelos apócrifos judaicos condicionou a interpretação da figura bíblica de Satanás, e não tem nada de estranho que assim fosse, enquanto perdurou o horizonte cultural que projetava em seres extraterrenos a origem dos males que afligem o homem. Também não tem nada de anormal que ela entre em crise quando começam a conhecer-se melhor as origens polimórficas desses males. Não se pode ignorar, contudo, que mesmo hoje esse universo mítico de forças do mal personalizadas continua a ser para muitos o horizonte de compreensão do mistério do mal.

Em tal horizonte cultural não há outro caminho para escapar ao dualismo maniqueísta senão a concepção de Satanás como um ser criado bom, um anjo, pervertido pelo pecado. Quando a interpretação maniqueísta da realidade ameaçou corromper a fé cristã, a Igreja teve que declarar com firmeza, no decreto Firmiter do Concílio de Latrão IV, que todos os seres existentes são criaturas do único Deus e que, portanto, os seres espirituais e corpóreos foram criados por Deus e que o Diabo só podia portanto ser um ser espiritual, criado bom por Deus, pervertido pelo pecado. "O diabo, portanto, e os outros demônios — define o Concílio — foram criados certamente bons na sua natureza, mas eles por si mesmos se tornaram maus."

O menos que se pode dizer a respeito do sentido desta definição é ser controvertido20 que o Concílio tenha definido positivamente a existência dos demônios, já que a intenção do Concílio era combater o dualismo maniqueu dos Cátaros: a crença em dois princípios da realidade: um bom, criador do mundo do espírito, e outro mau, origem do universo material. Grandes teólogos defendem que somente isto é o objeto da definição21. Os que defendem que é definida também a existência argumentam a partir da forma absoluta, não hipotética, da definição. A argumentação não convence. O Concílio não podia definir algo que não estava em forma alguma em questão e que o horizonte cultural e os procedimentos de hermenêutica bíblica da época não permitiam pôr seriamente em dúvida. Do contrário teríamos que admitir que um Concílio pode definir certas verdades por acaso. Seria uma concepção quase mágica da infalibilidade do Magistério.


Outros caminhos de interpretação?


A interpretação das figuras bíblicas com a ajuda do midrash judaico da Vida de Adão e Eva cristianizado condicionou durante séculos a leitura da Bíblia. No contexto cultural do mundo antigo, essa interpretação era quase inevitável. Hoje, no horizonte da modernidade, que permite analisar com facilidade a origem de muitos males sem atribuí-los a causas extraterrenas, e sobretudo com o avanço dos estudos de exegese e hermenêutica bíblicas, o teólogo tem o dever de perguntar-se se tal interpretação está em consonância com o conjunto da revelação bíblica. Certamente é possível encontrar caminhos de interpretação para as figuras bíblicas do mal que, evitando o dualismo maniqueu, salvando melhor a responsabilidade humana e com maior respeito dos textos bíblicos (respeito, que certamente não consiste na sua leitura fundamentalista), são capazes de superar as dificuldades que a estória dos anjos decaídos suscita para a teologia. Tais interpretações estão mais em consonância com os pontos centrais da fé e com a novidade libertadora do evangelho de Jesus Cristo.

Sempre foi difícil aos teólogos explicar como naturezas angélicas perfeitíssimas poderiam ter-se revoltado contra Deus de forma irrevogável. Pensar o caráter pessoal do Diabo e dos inumeráveis demônios obrigou também os teólogos a verdadeiros malabarismos filosóficos, na definição do conceito de pessoa. Mas há, a meu ver, duas dificuldades maiores que suscitam imediatamente a suspeita de que tal interpretação tenha entrado por caminhos sem saída.

1º A Revelação cristã jamais ousou afirmar de alguma criatura humana que esteja irremissivelmente condenada para sempre. A Revelação das penas eternas ou da morte eterna (as duas figuras são usadas na Bíblia) tem como finalidade alertar para a responsabilidade da liberdade humana. Ninguém poderá ser salvo se rejeita de forma definitiva a graça oferecida por Deus. Mas saber se, de fato, há alguém condenado ao Inferno, é uma curiosidade à qual a Revelação cristã não responde. Pertence ao mistério de Deus e da sua misericórdia. Ora, pretender saber que há infinidade de seres angélicos que foram condenados para sempre requereria, segundo a lógica e a congruência do conjunto das verdades reveladas, o apoio de uma clara e explícita afirmação bíblica sobre o fato, dada a gravidade da afirmação. E na Bíblia nada se diz a respeito.

2º Se o diabo e os demônios fossem seres angélicos condenados definitivamente, em forma alguma se explicaria, dentro da lógica da Revelação, por que são capazes de agir no mundo. Máxime sendo a afirmação central do cristianismo a vitória definitiva de Cristo sobre os poderes do mal. Que o mal continue no mundo, mesmo depois da vitória de Cristo, está em perfeita consonância com a Revelação, quando se trata do mal procedente de liberdades humanas, ainda a caminho da pátria definitiva. Isto porque, tão central como a vitória de Cristo sobre o mal, é que esta vitória se dá pelo amor, e o amor exige o respeito absoluto às liberdades.

O Catecismo da Igreja Católica, recentemente promulgado, apesar de seus méritos inegáveis, estranhamente mantém a hipótese dos anjos decaídos22. Tendo consciência desta dificuldade, vê-se obrigado a dizer que a "permissão divina da atividade diabólica — embora cause graves danos para cada homem e para a sociedade — é um grande mistério, mas ‘nós sabemos que Deus coopera em tudo para o bem daqueles que o amam’" (n. 395). Apelar desta forma para o mistério não é boa teologia. O "Mistério cristão" não pode ser um artifício parar escapar a dificuldades teológicas. O Mistério cristão, como foi dito acima, é a realidade da autocomunicação salvífica de Deus em Cristo. Deve-se dizer que a cruz de Cristo, a crucifixão do Filho de Deus, é um grande mistério. Insondável, certamente. Nela está em jogo o Mistério do amor e da misericórdia infinita de Deus, que superam toda inteligência. Mas esse mistério pode ser adorado, porque é o mistério de Deus que, quando acolhido, ilumina a vida humana, com tudo o que ela tem de dramático e até de trágico, embora o Mistério de Deus, ao revelar-se, não se "des-vele". Do contrário não seria o Mistério de Deus. Mas se o Mistério de Deus não se desvela e não pode ser nunca totalmente compreendido, pode-se, com a ajuda da graça, penetrar mais e mais nele, de forma que ele ilumine progressivamente toda a realidade. Encontrar Deus não é fazer a experiência do Sentido último de toda a realidade? O cristão realiza esta experiência na vitória da cruz do Cristo sobre o Mal em todas as suas manifestações.

Antes de tentar uma possível interpretação das figuras bíblicas do mal é necessário perguntar-se se a fé cristã obriga a crer nos anjos decaídos. A resposta deve ser negativa.

No Credo proclamamos a vitória de Cristo sobre o mal, a redenção e salvação do mundo na Cruz. A fé na cruz do Cristo implica necessariamente a afirmação da existência do mal que atinge a humanidade, cuja profundidade só se revela na "loucura da pregação" da cruz de Cristo. "Escândalo para os judeus e loucura para os gentios". Mas "poder de Deus para os que se salvam" (cf. 1Cor 1,21-24). O diabo, enquanto anjo decaído, não é objeto da fé cristã. Isto, porém, não quer dizer que devamos abolir a figura bíblica de Satã, ou do diabo, ou a personificação paulina do Pecado. Porque estas figuras têm a função de ajudar-nos a penetrar no abismo desconcertante e terrível do Mal, cuja profundidade só é comensurável com a profundidade do Mistério do Amor de Deus ao qual ele pretende se opor.


A perversão da liberdade criada ou a revolta da criatura contra Deus


A pergunta fundamental, portanto, deve ser: O que a Bíblia quer revelar com a figura do Diabo e dos demônios?

Que haja forças destrutivas no mundo, ninguém o pode negar. Que elas seduzem o ser humano e se apresentam, às vezes, como assustadoras e quase irresistíveis, faz parte da experiência comum da humanidade. Depois dos horrores dos massacres em massa e programados de milhões de inocentes, quem se atreverá a negá-lo. Que essas forças se apresentem como superando absurdamente a maldade que cada indivíduo pode isoladamente gerar, e que procedam como força sedutora da opção livre de cada indivíduo, explica que sejam facilmente projetadas no mundo invisível de espíritos perversos.

Mas escutando atentamente a Revelação, acolhendo de coração o mistério da Cruz de Cristo, e das forças que a causaram, sem interpretações preconcebidas ou precipitadas, Deus pode iluminar o cristão acerca dos poderes absurdos do mal que o ameaçam.

A primeira coisa que será preciso afirmar é que estas forças devem ter sua origem em seres livres e pessoais. Elas não podem ser forças maléficas da natureza, porque isso responsabilizaria a Deus pelo mal. Por outro lado, a reta razão e a revelação não permitem responsabilizar a uma determinada pessoa pelo mal do mundo, nem sequer por alguns deles, de forma isolada. Porque mesmo os causadores de males horrendos são também vítimas de forças sedutoras.

Se consideramos o ser humano isoladamente ou mesmo como ser social, mas já constituído totalmente em si, fora de qualquer relação com os semelhantes, pode-se incorrer facilmente na ilusão de conceber fora da humanidade e de forma mítica as forças sedutoras e destrutoras do mal. Mas se consideramos o ser humano, como um ser que nasce e se faz na relação com os outros, um ser que não pode ser pensado fora dessa relação, ou, se queremos, um ser que é linguagem (entendendo o termo no seu sentido mais amplo), que nasce, cresce e se faz na linguagem e enquanto linguagem, não é preciso acudir essas forças míticas para compreender que o poder sedutor do mal, sem identificar-se com cada ser humano e apresentando-se a cada um deles como exterior a si, possa ter origem no conjunto de todos eles ou, se queremos, na rede de relações por eles constituída.

A perversão da relação ou da linguagem, constitutiva dos seres humanos, mesmo procedendo deles, pode tornar-se uma força destrutiva e sedutora que se apresenta como exterior a cada indivíduo e que supera imensamente a maldade de cada uma das liberdades que a originam.

A Revelação bíblica vai mais longe. O homem é um ser chamado desde a sua origem à relação com Deus, um ser em diálogo com Deus, um ser que nasce pelo Espírito da Palavra criadora de Deus. O homem é constituído por uma linguagem sublime que é diálogo com Deus. E este diálogo com Deus constitutivo do ser humano (mercê, entenda-se, da gratuidade infinita do amor divino) envolve necessariamente o diálogo recíproco com todos os irmãos.

A conseqüência, à luz da Revelação divina, é óbvia. A perversão desse diálogo se torna uma força destrutiva e sedutora, cuja profundidade abissal corresponde à altura sublime do Mistério divino ao qual ela se opõe. Essa força é denominada, na Bíblia, de Satã: o Inimigo, o Adversário, o Acusador. Ela tem, de alguma forma, caráter pessoal: não existiria sem as pessoas. Não pode ser uma força da natureza23. Mas, sendo "pessoal", não pode, contudo, identificar-se com nenhuma dessas pessoas isoladamente. Pedro, conforme o testemunho do próprio Cristo, pode fazer em determinado momento o jogo de Satã (cf. Mc 8,33). Naquele momento, Satã não tentaria a Jesus, sem Pedro. Mas Pedro sozinho não é Satã. Por outro lado, é significativo que o motivo que leva Jesus a chamar o discípulo de Satã é o fato dele deixar-se seduzir por uma forma de pensar "humana", fechando-se assim a acolher os pensamentos de Deus.

Mas se Satã pode ser dito de alguma forma (ou de maneira analógica) "pessoal", porque tem sua origem na perversão das relações pessoais, na sua essência mais profunda, deve ser pensado como aquilo que há de mais impessoal e mais destrutor da pessoa nas relações humanas. Satã ou o Diabo, melhor diríamos no horizonte da modernidade, o diabólico ou satânico, com todas as forças demoníacas, é a máscara (que é outro sentido da palavra persona), a personagem que disfarça o conjunto das forças concretas destrutivas da pessoa. Mais que "pessoa" deveria ser dito a anti-pessoa por antonomásia. Merece bem as designações bíblicas de Adversário, Sedutor, Mentiroso, Homicida. Estas afirmações se situam na linha de pensamento de teólogos notáveis — W. Kasper, K. Lehemann, J. Ratzinger, R. Marlé24, entre outros —, levando-as às suas últimas conseqüências.

W. Kasper afirma: "O Diabo não é uma figura pessoal senão uma não-figura que se dissolve em alguma coisa de anônimo e sem rosto, um ser que se perverte no não-ser: é pessoa no modo de não pessoa"25. Mais claramente Kertelge afirma: "Na concepção bíblica pecado e morte aparecem como entidades personificadas. É possível também individualizar traços e estruturas pessoais nas figuras dos demônios e potências do mal. Mas, embora nas descrições bíblicas o diabo seja representado como uma entidade pessoal, é certo que não se lhe pode atribuir o conceito de pessoa como título de dignidade; conceito que se emprega ao referir-se a Deus e ao homem. O diabo aparece ao contrário como a perversão da dignidade pessoal".

Podemos conceber o Diabo e os demônios, mais do que como um Ente pessoal, como um "entre". Como o conjunto de poderes maléficos que estão entre os homens e que pervertem suas relações pessoais. Tem sua origem nas pessoas, mas são o que de mais impessoal e anti-pessoal pode conceber-se. Esta categoria é sugerida por Ratzinger e retomada por R. Marlé. Aqui porém é entendida de forma diferente.

"O pensamento moderno — escreve Ratzinger — dispõe, parece-me, de uma categoria que pode ajudar-nos a compreender de novo mais precisamente o poder dos demônios, cuja existência, é verdade, é independente desta categoria. Os demônios são um poder do ‘Entre’ ao qual o homem não cessa de ser confrontado sem que ele a possa fixar como uma coisa. É precisamente o que Paulo tem em mente quando ele fala dos ‘dominadores deste mundo das trevas’; quando diz que, contra eles — estes espíritos do mal que estão nos ares —, nosso combate não é dirigido contra a carne e o sangue (Ef 6,12). Ele é dirigido contra este ‘Entre’ firmemente estabelecido, que, ao mesmo tempo, encadeia os homens uns aos outros e os separa uns dos outros; este ‘Entre’ que os violenta, jogando diante deles o jogo da liberdade. Tem-se aí um traço específico do demoníaco: sua ausência de rosto, seu anonimato. Quando se pergunta se o diabo é uma pessoa, dever-se-ia responder com mais propriedade que ele é a não-pessoa (ou o antipessoal: Die Un-person, com o UN privativo de desintegração), a ruína do ser pessoal, e é por isso que é característico de sua natureza apresentar-se sem rosto; sua força própria é não deixar reconhecer. Fica firme em todo caso que este ‘Entre’ é uma potência real, melhor: um conjunto de potências e não simplesmente uma adição de eus humanos."26

Quando Ratzinger afirma que esse conjunto de potências é mais do que uma soma de eus humanos, está pensando em seres extramundanos? Parece que sim, posto que estas palavras foram escritas em resposta ao opúsculo de H. Haag, Abshied vom Teufel (Adeus ao Diabo)27. Não é fácil, porém, conceber que tipo de ser deve ser atribuído a esse "entre", ao qual é negado por um lado o "ser pessoa", mas por outro se nega que seja uma simples adição de eus humanos e uma personificação das potências do mal.

Não é necessário pensar em seres extramundanos para manter a afirmação de que a Bíblia entende por forças demoníacas é mais do que a soma de eus humanos. Aí está talvez o cerne da importância e da profundidade simbólica da figura bíblica: quando se perverte a relação humana — relação que tem sua raiz e seu fundamento em Deus, no chamado à comunhão com Deus —, ela deixa o mundo e na história uma força maléfica que supera muito, em capacidade de sedução e de perversão, a soma do poder de sedução de cada liberdade humana pervertida. Isso é devido à complexidade e riqueza do ser humano, criado para ser "a imagem de Deus", senhor da e responsável por toda a criação. As ciências antropológicas e sociológicas modernas, em diálogo interdisciplinar com a teologia, poderiam ajudar a compreender isto. Que as conseqüências da negação de Deus pelo homem ultrapassem a soma das liberdades humanas pervertidas tem sua explicação radical no chamado de toda realidade criada a ser, de alguma forma, "anjo" ou mensageiro de Deus, como a Bíblia testemunha constantemente. Quando o homem se revolta contra Deus não perverte apenas a sua liberdade individual. Sendo um nó de relações com o universo e mediador por vocação divina da orientação de todas as coisas para Deus, a negação humana de Deus desencadeia forças de perversão que adquirem proporções assustadoras e incontroláveis pelas decisões livres que as originaram.

Isto se compreende melhor em contraponto — como mostra o evangelho de Marcos — com a figura do Espírito. É pelo poder do Espírito que o Cristo vence Satanás. E que é o Espírito senão a comunhão entre o Pai e a Palavra eterna de Deus? Ratzinger afirma "o Espírito Santo é este ‘Entre’ no qual o Pai e o Filho são um". Jesus nos dá o seu Espírito para restabelecer a relação violada pelo Pecado, e sempre por ele ameaçada, dos homens entre si e com Deus.

Eis pois a finalidade das figuras bíblicas de Satã ou Diabo, do Pecado, do Dragão, da Serpente... Elas nos ajudam a penetrar na profundidade abissal do mal enquanto negação de Deus por um ser criado à imagem de Deus. Para compreender o mal apenas nas suas dimensões físicas, sociológicas, psíquicas e outras semelhantes, essas figuras seriam dispensáveis. Para o compreender na sua dimensão "teológica" elas são imprescindíveis.

Se a revelação cristã não dependesse constantemente da função "normativa" dos escritos bíblicos, poderia talvez a Igreja escolher entre essas figuras a que mais se adaptasse a uma determinada época ou substituí-la por outras. Mas tendo que voltar uma e outra vez aos escritos que são a norma da Palavra viva de Deus a cada instante, não resta outro caminho senão a paciente hermenêutica das figuras bíblicas que não podem ser abandonadas por respeito à Palavra que se fez carne.

Essa hermenêutica não deve apenas ser deixada para os teólogos de profissão. Ela deve chegar ao povo cristão que cada dia "ouve" os textos arcaicos para encontrar-se com a Palavra viva. Quando a Bíblia era afastada das mãos do povo cristão os teólogos podiam permitir-se o arbítrio e o luxo de fazer da hermenêutica privilégio de especialistas. Com a Bíblia nas mãos de todos, ensinar a interpretar a linguagem mítica no mundo da linguagem científica e técnica, é o único caminho para que as igrejas não se tornem responsáveis, por seu silêncio, pela utilização mágica e feiticista da figura do Diabo para a alienação da responsabilidade humana, para a vergonhosa exploração da miséria ou até para os mais inconfessáveis crimes, como a história do passado nos recorda28.

Cristo vence esses poderes no seu próprio terreno, tornando-se ele próprio vítima deles, vítima expiatória, ao aceitar livremente e por amor a morte que lhe é infligida pela violência. Violência que nasce da perversão das relações humanas e que, na cruz de Cristo, atinge sua virulência extrema. Jesus vence pelo poder do Espírito de Deus, que nos é dado, para que possamos, com ele, vencer o "entre" pervertido que chamamos demônio e que continuará a perturbar-nos enquanto a humanidade — na sua totalidade — não tiver acolhido o Espírito Santo, no qual o Pai e o Filho são Um e no qual nós somos um no Cristo.

Compreende-se porque o evangelho de Marcos é concebido do começo ao fim como uma luta de Cristo com Satã, pelo poder do Espírito de Deus, e uma paradoxal vitória, quando, aos olhos do mundo das trevas, parece ser vencido por ele, ou seja, pelas potências que se opõem ao Reino de Deus.


Uma última palavra sobre os exorcismos


Que os endemoninhados sejam doentes psíquicos é uma verdade dificilmente contestável, perante o avanço da ciência psiquiátrica e psicanalítica. Que a sua cura tem, nos relatos evangélicos a significação simbólica — que continua válida para nós — da luta e da vitória do Senhor ressuscitado contra as potências do mal, simbolizadas por Satanás, é ainda mais evidente.

O NT fala de pessoas endemoninhadas ou que têm demônios, mas não de pessoas possuídas por Satanás ou pelo Diabo. A terminologia de possessão "diabólica" implica já uma determinada interpretação das figuras bíblicas, que fez não poucos estragos na história. Recordem-se as caças às bruxas na Idade Média!

Ao longo da história, o conceito de pessoa endemoninhada muda notavelmente. No NT, este conceito é dado apenas a pessoas doentes. E sempre se distinguem os demônios do Diabo ou Satanás, embora nota-se uma tendência na mentalidade popular a fazer das forças demoníacas, responsáveis por certas doenças, satélites do Diabo. Mas esta mentalidade não é assumida pelo NT. Mais tarde, na história da Igreja, começa-se a usar o termo demônio como sinônimo de diabo (e até hoje em traduções de textos bíblicos e em livros litúrgicos encontramos esta confusão, bastante perniciosa para a teologia29).

Nunca, nos evangelhos, se fala de uma expulsão de Satanás ou do Diabo por parte de Jesus. A cura dos endemoninhados junto com a cura de outros doentes são um sinal que deve acompanhar a pregação do Reino. "Ao confiar aos discípulos — afirma Kertelge — a missão de curar como ele os doentes e expulsar os demônios (Mc 3,14s e par.; 6,7-12 e par.) convida-os à práxis do seu anúncio do Reino de Deus em palavras e obras, e não à assunção de determinadas práticas rituais."30 Não há nenhum indício nos evangelhos de que Jesus associe de qualquer forma os endemoninhados com o pecado pessoal. Satanás ou o diabo, ao contrário, é o símbolo do pecado, da oposição ao Reino de Deus. O Diabo nunca é objeto de exorcismos.

Os exorcismos, tal como se realizaram depois na Igreja, adquiriram um sentido bem diferente. É claro que existe no Batismo, desde os primeiros séculos, um rito exorcístico que não é senão uma oração sobre o catecúmeno, pedindo que Deus afaste dele todas as manifestações do mal, simbolizadas na Bíblia pela figura de Satanás. Junto com este gesto sacramental está a renúncia do catecúmeno a Satanás e a todas as suas "pompas e vaidades". O contexto é suficientemente simbólico (ou sacramental) para indicar o sentido do rito. A renúncia a Satanás é o contraponto da adesão ao Cristo, vencedor de Satanás.

Como dizíamos, Satanás não pode ser objeto de fé. Se assim fosse, cairíamos na magia. Porque a fé é eminentemente relação pessoal e é precisamente isso que não é possível diante da figura bíblica do Diabo. Perante as forças sombrias e enganosas por ela simbolizadas só cabe uma atitude: a renúncia. Mas uma renúncia feita na confiança que nasce da adesão ao Cristo vencedor de todos os poderes diabólicos.

Mas se Satanás não pode ser objeto de fé, também não pode ser, em primeiro lugar, objeto de conhecimento. Compreender a figura do mal, nas suas obscuras e sempre enganosas manifestações equivaleria a compreender o incompreensível: o abismo sem fundo da negação de Deus pela Criatura. No Mistério de Deus, podemos ser introduzidos pela sua graça. A negação do Mistério, a recusa de acolher a autocomunicação de Deus equivale a precipitar-se no abismo assustador do Nada.

O dever do cristão é pois renunciar a Satanás e, para isso, se o caminho do conhecimento está interditado, não o está o do discernimento dos seus enganos e das suas astúcias. Discernindo em nós quais são os pensamentos de Deus, do Espírito que nos é dado para vencer Satanás, e quais são os pensamentos humanos, ou seja os pensamentos que se recusam a acolher a manifestação de Deus na vida humana, ou ainda em outras palavras, vencendo a tentação de querer ser como Deus, Satanás pode ser vencido a cada momento.

Conforme a mentalidade antiga — presente em numerosos textos extra-bíblicos de exorcismos e refletida de alguma forma nos evangelhos — o exorcista devia conhecer o nome do demônio para o poder dominar e expulsar. Na concepção de Satanás ou das forças demoníacas proposta pela nova hermenêutica dos textos bíblicos, isto é muito mais verdadeiro. Só examinando em cada situação concreta, através do discernimento dos espíritos, quais são "os demônios" que atormentam as pessoas, as comunidades e os povos, poderemos com as armas do evangelho — auxiliadas pelas ciências que se ocupam dos distúrbios das pessoas e das sociedades — lutar contra o mal de forma eficaz.

A história do cristianismo, em concreto a forma como foi concebida e exercida muitas vezes a sua missão "exorcística", faz suspeitar que em muitas ocasiões pode ter-se recaído em "crenças não cristãs" do Diabo. Quantas vezes os sistemas repressivos que pretendiam combater as ações atribuídas ao diabo e às pessoas nelas envolvidas eram eles mesmos diabólicos!

O fenômeno da possessão diabólica é um fenômeno complexo que envolve fenômenos físicos acompanhados de fenômenos parapsíquicos. Os que continuam a defender que o fenômeno é causado pela ação de Satanás, concebido como um ser pessoal extramundano, o definem de forma mais ou menos semelhante a esta: "A possessão diabólica consiste no domínio que Satanás exerce diretamente sobre o corpo e indiretamente sobre a alma de um indivíduo. Trata-se de um fenômeno extraordinário, dos mais graves e terríveis que transforma irresistivelmente a pessoa envolvida em instrumento do poder despótico e perverso do diabo". Assim por exemplo se expressa Balducci31. Os seus argumentos, como os de outros que defendem a possessão diabólica, não são em forma alguma convincentes. Balducci afirma que fenômenos psicopatológicos, juntamente com fenômenos parapsíquicos (chamados por Balducci de "metapsíquicos") constituem um forte indício de uma possessão diabólica. J. Mischo objeta que há aqui um sofisma, não um aumento qualitativo de fenômenos para atestar uma causa sobrenatural. Os fenômenos que ele chama de metapsíquicos e que, na realidade, não são senão parapsíquicos, são tão naturais como os outros32.

Isto é só um exemplo da fragilidade da argumentação dos que sustentam a existência de possessões diabólicas. As imagens de Deus que implicam estão não raras vezes em aberta contradição com a imagem de Deus revelada em Jesus Cristo. Um Deus que vence o mal em Jesus Cristo não pode divertir-se envolvendo seus filhos nos intrincados labirintos e enigmas criados pelas especulações com as possessões diabólicas, diante das quais o homem se sente impotente e ameaçado por um poder totalmente irracional e incontrolável.

Acresce-se que os possessos geralmente são vítimas e não culpados. O fenômeno da possessão pode ser interpretado como projeção coletiva, sobre uma vítima, dos temores e distorções de um determinado grupo social. Possesso é aquele que sucumbe a essa acusação coletiva, explícita ou subliminar, feita em nome de um poder divino e se identifica com o juízo negativo que os outros fazem contra ele. É claro que o fenômeno pode revestir-se das mais diversas formas e até envolver também a conivência, culposa ou não, da vítima33.

Pois bem, levar tais vítimas de uma introjeção coletiva ao exorcista, é a melhor forma de reforçar a projeção introjetada. A Igreja hoje tem a capacidade de reconhecer — e de fato existem pronunciamentos de autoridades eclesiásticas neste sentido — casos que, no passado, por condicionamentos culturais, julgou ser da competência do "exorcista", devem ser confiados ao médico, ao psicólogo ou ao parapsicólogo34.

É claro que estas breves linhas não podem tratar o assunto com a profundidade que a sua complexidade requereria e que só um estudo interdisciplinar poderia tratar adequadamente. Elas não pretendem ser senão a conseqüência lógica da interpretação da figura bíblica do Diabo e dos demônios apresentada neste artigo.


Concluindo sem concluir


Sendo preciso concluir de alguma forma, terminarei com esta advertência, para evitar mal-entendidos: A reinterpretação das figuras bíblicas do Diabo e dos demônios não pretende reduzir o mal a seus aspectos psicológicos, sociológicos ou políticos. As figuras bíblicas continuam necessárias para descobrir a raiz última do mal e dos temores que afligem a humanidade: a rebelião contra Deus ou a sua negação ou ainda o seu esquecimento. "Conhecer o nome dos demônios" que tentam dominar os homens e mulheres de nosso tempo é um primeiro passo necessário para acolher a vitória do Cristo sobre o mistério do mal, que, na sua profundidade abissal, tem o nome de Satanás: com este nome a Bíblia designa o conjunto dos poderes que se opõem ao reino de Deus e, concomitantemente, à vida em liberdade dos irmãos.

Não se trata portanto de tentar explicar de forma racionalista o mal, tirando "a máscara do Diabo". O que está em jogo é algo muito mais sublime e mais vital para a vida cristã e para a evangelização do terceiro milênio. O primeiro milênio do cristianismo não tinha perdido o senso do simbólico presente na Bíblia, apesar do seu empenho em dialogar com a filosofia grega. Estão a testemunhá-lo os escritos dos Padres. No segundo milênio, a teologia pactuou não poucas vezes com o racionalismo dominante, apesar de ver-se ameaçada pelas descobertas científicas da modernidade. É possível esperar, se for levada a sério a consciência da autonomia das realidades terrenas afirmada pelo Vaticano II, que a Igreja do terceiro milênio reencontre em profundidade o senso e a linguagem simbólicos, porque somente assim poderá falar de Deus aos homens, de forma verdadeiramente significativa. Então talvez será compreendida a função das figuras bíblicas do Diabo e dos demônios e os cristãos se decidam a "renunciar" verdadeiramente a Satanás como "perversão do divino"35 (desse caráter divino que, pela graça de Jesus Cristo, está impresso em toda a criação) e a acolher decididamente a glória de Deus que se manifestou na cruz de Cristo e deve continuar a manifestar-se no seu Corpo, a Igreja, em luta contra todas as máscaras do mal que escravizam tantos irmãos.

Não se nega o Diabo como ser pessoal por veleidade, ou prurido teológico de modernidade, mas apaixonados pela glória de Deus! É essa paixão pela glória do Pai que levou o Cristo à cruz.




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1 São Paulo, Paulinas, 1989.

2 Petrópolis, Vozes, 1976.

3 Paris, 1984. Citado da ed. espanhola: Salamanca, Ed. Sígueme, 1986, p. 364.

4 KERTELGE, K. "Diavolo, demoni, exorcismi in prospectiva biblica", em KASPER, W. - LEHMANN K. (eds.), Diavolo - demon -possessione. Sulla realtà del male. Brescia, Queriniana, 19852, p. 43.

5 Já em 1978 o teólogo, atualmente bispo, W. Kasper se referia com esta expressão ao fenômeno. Cf. "Il problema teologico del male", em KASPER, W. - LEHMANN, K. (eds.), Diavolo - demon - possessione, p. 45.

6 MARLÉ, R., "Victoire du Christ sur les forces du mal", Esprit et vie 104 (1994) 465.

7 Le conflit des interprétations - Essai d’hermenéutique. Paris, 1969, p. 16s.

8. CHAUVET, L.-M. Symbole et sacrement. Une relecture sacramentelle de l’existence chrétienne. Paris, Ed. du Cerf, 1990, p. 196.

9 O absurdo do mal pode ser chamado de "Mistério", mysterium iniquitatis, enquanto supõe a violação do Mistério que, na linguagem cristã, é propriamente a autocomunicação salvífica de Deus em Cristo.

10 Se, a séculos de distância, no livro da Sabedoria, já nos albores da realização das promessas messiânicas, a queda de Adão é atribuída à inveja do diabo e, no Apocalipse 20,2, diz-se que o dragão vencido pelo poder do Cristo é a antiga serpente, que é o Diabo e Satanás, o texto permite tanto interpretar a serpente do Gênesis pela figura bíblica de Satanás, como Satanás pela figura bíblica da serpente. E certamente não obriga a identificar todas essas figuras com a concepção extrabíblica do Diabo como um anjo pervertido. Isto ficará mais claro no decorrer do artigo.

11 Cf. KITTEL (ED.) VERBETES: d a i m o h , d a i m o h i o h , d i a b o l o z , å a t a n a z , Theological Dictionary of the New Testament, II e VII, AnnArbor 1973, 1975. KERTELGE, K. "Diavolo, demoni, exorcismi in prospectiva biblica", em KASPER, W. - LEHMANN, K. (eds.), op. cit., p. 7-44. ÁLVAREZ, A. "¿El diablo y el demonio son lo mismo? Aclaraciones para una correcta comprensión", SelTeol 34 (1995) 61-64. Condensado de ¿El diablo y el demonio son lo mismo?, El liberal, 1993. FRAIJÓ, M. Satán en horas bajas. Madrid, Sal Terrae, 1993, p. 20-31 (Fé y secularidad).

12 Op. cit., p.16 s.

13 Cf. Vida de Adán y Eva, 9-16, em MACHO, A. D. (org.), Apócrifos del Nuevo Testamento II, Madrid, 1983, p. 340-341. Por seu interesse para entender a permanência durante séculos da figura de Satanás, que tem sua origem nestas tradições extrabíblicas do período intertestamentário, anexamos como apêndice a este artigo a tradução do texto.

14 Cf. Jó 3,8.

15 Sobre os exorcismos, ver: KERTELGE, K. "Jesus, seus milagres e Satanás", Concilium 103 (1975/3) 295-303. GONZÁLES-FAUS, J. I., "Jesús y los demonios. Introducción cristológica a la lucha por la justícia", EstEc 52 (1977) 487-519.

16 Interpretar estes diálogos como reminiscências dos fenômenos parapsíquicos dos possessos é um fundamentalismo ingênuo que desconhece a estudada composição dos mesmos e a sua função teológica no conjunto do evangelho. Significa ignorar os métodos narrativos dos judeus.

17 Cf. Art. cit., p. 26 s.

18 Cf. SCHWAGER, R. "Quién o qué es el diablo?", SelTeol 33 (1994) 137. Condensado do artigo: "Der vom Himmel gefallene Satan. Wer oder was ist der Teufel?, Theologie der Gegenwart 35 (1992) 255-264.

19 Sobre este tema pode ver-se o sugestivo artigo de GAUTHIER, J-M. "Quand un pauvre diable est prince de ce monde ou le scandale de Satan selon René Girard", Théologiques 5 (1997) 7-22.

20 E isto já bastaria para que a pregação cristã e a catequese não possam impôr uma determinada interpretação dos textos bíblicos como vinculante para a fé. Isso implicaria pôr um obstáculo (escândalo ou pedra de tropeço) para a acolhida da fé cristã a quem não aceitasse tal interpretação.

21 Cf. KASPER, K., op. cit., p. 58-59.

22 Se bem que ao menos tem o mérito de não dedicar ao tema mais do que uns poucos parágrafos (nos 391-394).

23. A insistência no caráter "pessoal" do Diabo em algumas afirmações do magistério é perfeitamente explicável e justificada. Do contrário, haveria que atribuir ao Deus criador a origem do mal. Que essas afirmações devam ser reinterpretadas em outros contextos culturais não tira a verdade nelas contida.

24 Cf. MARLÉ, R., art. cit.

25 KASPER, K., op. cit., p. 72.

26 RATZINGER, J., "Abschied vom Teufel?" em Dogma und Verkündigung. München, Erich Wewwel, 1973, p. 225-234, esp. 234.

27 HAAG, H. Abshied vom Teufel. Einsdiedeln, 1969. Ver também do mesmo autor: Teufesglaube. Tübingen, Katzmann, 1974. HAAG afirma que o Diabo não é uma pessoa mas a personificação do Mal.

28 Cf. neste sentido: VERNETTE, J., "Retour du Diable. Silence des Eglises?", Lumière & Vie 42 (1993/2) 5-14. GÉREST, C. "O demônio no panorama teológico dos caçadores de bruxas", Concilium 103 (1975/3) 304-319.

29 Um exemplo: Na leitura breve das Completas da Liturgia das Horas, publicadas em Portugal, lemos: "Sede sóbrios e estai vigilantes: o vosso inimigo, o demônio, anda à vossa volta, como leão que ruge...". O original grego da 1.ª carta de Pedro 5,8, donde é tirada a leitura breve, usa o termo diábolos. Deveria, portanto, ser traduzido por diabo. Para interpretar toda a força simbólica da exortação de Pedro à vigilância, não é preciso imaginar esse inimigo como anjo decaído. A virulência da luta do "inimigo" do reino não diminui em nada pelo fato de abandonar a interpretação mítica. Ao contrário, tirando a máscara "mítica" do inimigo, o cristão poderá reconhecer melhor o perigo que o ameaça e encontrar as armas mais apropriadas para lutar contra ele.

30 "Diavoli, demoni...", op. cit., p. 34.

31 "Priester, Magier, Psichopathen", no livro intitulado Die teufishe Besessenheit, p. 93, citado por J. Misho, "La ‘possessione diabolica’. Sulla psicologia delle reazioni irrazionali", em KASPER, W. - LEHMANN, K. (eds.), Diavolo - demoni - possessione. Sulla realtà del male. Brescia, Queriniana, 19852, p. 166.

32 Depois do Concílio Vaticano II a figura do exorcista não existe mais oficialmente. Também não está em vigor o rito do exorcismo. A Igreja permite, contudo, que uma diocese tenha um exorcista para esses casos estranhos em que as pessoas acreditam que estão possuídas por um demônio. No passado, sempre limitou o ministério do exorcismo a pessoas muito especializadas, para que não confundissem um simples fenômeno psicológico com o que se dizia antigamente ser uma possessão do demônio, sempre relacionada com problemas psicológicos e psiquiátricos difíceis de serem resolvidos. A condescendência da Igreja, neste assunto como em tantos outros, após as reformas que seguiram ao Vaticano, é certamente uma deferência com os bispos, padres e teólogos que defendem as antigas formas de conceber o Diabo. Ver, entre os defensores desta posição, LAURENTIN, R. Le démon, mythe ou réalite? Enseignement et expérience du Christ et de l’Église. Fayard, 1995. Para notícia do movimento que promove a restauração da figura "tradicional" (?) do exorcista e a promulgação de um novo ritual para o exorcismo: JAY, P. "Quelques réflexions sur les exorcismes. (A propos des ouvrages de G. AMORTH: Un exorciste raconte et Nouveaux récits d’un exorciste)", Esprit et vie 104 (1994).

33 Ver SCHWAGER, R., "Der vom Himmel gefallene Satan. Wer oder was ist der Teufel?", Theologie der Gegenwart 35 (1992) 255-264. Condensado em "Quién o que es el Diablo", SelTeol 33 (1994) 136-140.

34 Evidentemente não podemos tratar aqui toda a complexidade do fenômeno. Ver: MISHO, J., art. cit., p. 168. Ver tb. do mesmo autor "Perspectivas diagnósticas e psico-higiênicas interdisciplinares em casos de ‘possessão diabólica’", em Concilium 103 (1975/3) 328-345.

35 Conforme a conhecida expressão de P. Tillich. Cf. RICHARD, J., "Le démonique comme perversion du divin d’après Paul Tillich", Teologiques 5 (1997) 89-113.




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Apêndice


Satanás na "Vida de Adão e Eva"

Enquanto Adão pronunciou estas palavras, todos os seres vivos acorreram e o rodearam, e naquele momento a corrente do rio se deteve. Então Adão invocou aos gritos o Senhor Deus e a sua garganta enrouquecia a cada dia que passava. Todos os seres vivos estiveram chorando com Adão dezenove dias.


Satanás engana Eva pela segunda vez


Neste momento Satanás, seu inimigo, sobressaltou-se, transformou-se num anjo resplandecente e foi ao rio Tigris, onde se encontrava Eva. Ao vê-la chorando com uma dor tão enorme, também ele deitou a chorar. A seguir lhe disse:

— Saí daí, voltai, descansai e não choreis mais. Deixai já a tristeza, que tanto vos abruma, pois o Senhor escutou vossa lamentação e aceitou vossa penitência. Todos os anjos e eu temos implorado em favor de vossa aflição; e ele me envia a tirar-vos da água e devolver-vos os alimentos que tivestes e perdestes pelo pecado. Saí portanto e eu vos conduzirei ao lugar onde está preparada vossa comida.

Saiu Eva da água; sua carne estava como a erva pelos rigores da água. Mas, ao começar a caminhar, desmaiou e ficou semi-morta quase todo o dia. O diabo levantou-a do chão e ela, junto com ele, caminhou até Adão. Adão ao vê-los exclamou entre soluços:

— Eva, onde estão os teus rigores penitenciais? Como te deixaste seduzir pelo teu adversário, aquele que nos afastou da morada do paraíso e da alegria espiritual?

Eva, ao ouvir isto, caiu na conta de que o diabo a tinha seduzido, ao persuadi-la que saísse do rio; prostrou-se por terra e duplicou sua dor, seus lamentos e seu pranto. Adão por sua vez exclamou:

— Ai de ti, diabo, que não deixas de acometer-nos com tamanha dureza! Que tens a ver conosco? Que te fazemos para que nos persigas com tanto engano? O que temos a ver com a tua maldade? Por acaso te arrebatamos a tua glória ou provocamos a tua desonra? Seremos teus inimigos ímpios e invejosos até a morte?


A adoração de Adão, motivo de queda do demônio


O diabo, entre lágrimas, replicou-lhe:

— Adão, toda minha hostilidade, inveja e dor vêm por tua causa, já que por tua culpa fui expulso da minha glória e afastado do esplendor que tive no meio dos anjos; por tua culpa fui jogado na terra.

Adão respondeu-lhe:

— O que eu te fiz ou em que consiste minha culpa se eu não te conhecia?

O diabo insistiu:

— O que estás dizendo? Que nada fizeste? No entanto, por tua culpa eu fui expulso. No mesmo dia em que foste formado eu fui expulso da presença de Deus e afastado da companhia dos anjos, quando Deus inspirou em ti o sopro vital e teu rosto e tua figura foram feitos à imagem de Deus; quando Miguel te trouxe e fez que te adorássemos diante de Deus, e Deus disse: "Adora a imagem do Senhor Deus". Eu respondi: "Não, eu não tenho por que adorar Adão". Como Miguel me forçasse a adorar-te, eu lhe respondi: "Por que me obrigas? Eu não vou adorar a alguém pior do que eu, posto que eu sou anterior a qualquer criatura, e antes de que ele fosse feito eu já tinha sido feito. Ele deve adorar-me e não o contrário". Ao ouvir isto o resto dos anjos que estavam comigo se negaram a adorar-te. Miguel insistiu comigo: "Adora a imagem de Deus". E eu respondi: "Se Ele se irrita comigo, porei meu trono por cima dos astros do céu e serei semelhante ao Altíssimo". O Senhor indignou-se contra mim e ordenou que me expulsassem do céu e da minha glória junto com os meus anjos. Desta forma, fomos expulsos, por tua culpa, das nossas moradas e jogados à terra. No mesmo instante submergi na dor, porque tinha sido despojado de toda a minha glória, enquanto tu eras todo mimo e alegrias, aquilo mesmo do que eu tinha sido privado anteriormente.

Ao escutar estas palavras, Adão gritou entre soluços:

— "Senhor Deus, minha vida está nas tuas mãos; faz que este inimigo que tenta deitar a perder a minha alma, se afaste de mim. Devolve-me a glória da qual fui expulso".

E o diabo desapareceu da sua vista. Adão, por sua vez, mantinha-se na sua penitência de quarenta e sete dias na água do Jordão.


"Vida de Adão e Eva 9,1-16", trad. do castelhano da obra de MACHO, A. D. (org.), Apócrifos del Nuevo Testamento II. Madrid, 1983, p. 340-341.




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Endereço do Autor:
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Théologiques 9/1 (2001) 17-48

La théologie face aux changements des représentations du cosmos
Quelle odyssée et pour quitter quels héritages ?


Pierre GISEL
Faculté de théologie Université de Lausanne


Nos connaissances sur le cosmos — ses origines, les lois de son
déploiement, sa fin — changent. Nos manières d’éprouver le rapport
de l’humain au monde en sont affectées, comme les représentations
que nous pouvons en avoir aux plans psychologique, philosophique,
culturel (dans les arts, la littérature, le cinéma, diverses oeuvres de fiction,
etc.)
Que l’on pense à la révolution psychologique et culturelle qu’a
constitué le passage d’une représentation qui plaçait la terre au centre
du cosmos et l’humain au centre de la terre, et qui, en outre, insérait
l’ensemble dans une courte durée (au plus sept mille ans et non quinze
milliards d’années par exemple), à un monde infini, disséminé ou pluriel,
et peut-être en explosion. Plus près de nous, la théorie de la relativité
ou la physique quantique, comme les travaux de ces dernières
décennies sur le cerveau, ont aussi bousculé nos représentations du
cosmos et des rapports de l’humain au monde et à la nature. En revisitant
le passé de notre aire culturelle, l’Occident, du Proche-Orient
ancien, de l’Égypte et de la Mésopotamie, puis de l’Antiquité grécoromaine,
de l’Antiquité tardive et de l’aventure du christianisme, on
s’aperçoit que l’histoire a traversé bien des changements de visions du
monde et de paradigmes, elle a connu bien des acculturations ou des
métissages socio-culturels. Ce n’est ni la première, ni la dernière fois
que l’homme connaît de tels changements.
Foncièrement, sauf le fondamentalisme — un produit moderne au
demeurant, inséparable d’une conjoncture marquée par les rationalismes
des XIXe et XXe siècles — et l’aberration scientifique et religieuse
18 PIERRE GISEL
qu’est le créationnisme1, la théologie chrétienne a toujours entrepris
de remettre sur le métier sa compréhension de l’humain et du monde
(il y a donc « odyssée »), et dès lors de repenser son propre discours,
son statut, les limites de sa validité et sa portée. Non sans oscillations
entre mouvements de réforme et nostalgies, innovations et relectures
diverses du passé, protestations, tensions avec le présent et utopies.
C’est qu’il n’y a pas de christianisme hors des jeux différenciés d’institutionnalisation
et de contestation, et ce, dès les premiers siècles, au
coeur du Moyen Âge, comme au long des Temps modernes, de la
Renaissance aux Lumières et à la postmodernité.
Dans la présente contribution — délibérément synthétique vu
l’ampleur des champs et des problèmes, et du coup de la bibliographie
—, je me propose le parcours suivant : 1) un rappel des données
scientifiques élémentaires, 2) un aperçu tout aussi élémentaire des données
bibliques et chrétiennes à ce propos 3) une proposition de balisage
théologique au regard de la non-homogénéité ou des contradictions
qui se dégagent de la confrontation des deux premiers points, 4) un
retour sur les types d’articulation possibles entre le savoir scientifique
et le fait du croire, 5) un aperçu touchant la question du statut de la
théologie.
1. Rappel de données scientifiques
L’univers a une histoire, celle de la matière qui s’organise. A partir
d’un big bang de départ, selon la vision qui semble le mieux correspondre
à l’état de nos connaissances scientifiques et à l’ensemble des
observations faites jusqu’à présent, et au gré d’une évolution qui voit
l’univers se refroidir, se dilater et se structurer, à très petite échelle (le
monde des particules) comme à très grande échelle (les galaxies et les
amas de galaxies). C’est progressivement que se prépare pour ainsi
dire un berceau dans lequel la vie va éclore, à quoi il faut ajouter l’idée
qui s’impose aujourd’hui d’une continuité entre l’évolution de l’univers
et celle de la vie, donc entre l’inerte et le vivant.
1. Pour ma position sur ce sujet, je renvoie au livre écrit avec Lucie
KAENNEL, La création du monde, Genève-Bienne, Labor et Fides-Société
biblique suisse, 1999, p. 111-118, livre qui se tient par ailleurs en l’arrièreplan
de certaines sections du présent article.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 19
On sait par ailleurs que les théories fixistes (pour exemple, Georges
Cuvier, 1769-1832) ont fait place à des transformismes. Le nom
de Charles Darwin (1809-1882) est ici emblématique, avec la théorie
évolutionniste. On considère aujourd’hui comme faits biologiques
acquis qu’il y a croissance exponentielle du vivant, que seule une
petite partie des individus survit et se reproduit, que la destruction se
fait selon un processus sélectif (sélection naturelle). Enfin, il importe
de souligner que pas plus qu’il ne peut être question d’établir un commencement
de la vie, il n’est véritablement possible de déterminer un
commencement de l’homme, l’évolution étant en outre de toute
manière non linéaire.
Pour résumer, on peut dire que la complexification, la structuration,
l’adaptabilité, l’irréversibilité, le facteur temps, les phénomènes
de sélection sont autant de paramètres qui entrent en ligne de compte
dans une évolution de la vie fortement marquée par l’environnement.
Touchant l’humain, il convient d’ajouter des considérations relatives
au fonctionnement du cerveau. En effet, on a affaire ici à ce qui
représente le point extrême de l’évolution dont le cerveau humain
garde secrètement la mémoire accumulée. De plus, on touche là certaines
des avancées les plus neuves de la recherche scientifique contemporaine,
avancées qui posent des questions redoutables à la foi, à
la théologie, et plus largement, à la culture et aux sociétés.
Les travaux récents en biologie moléculaire et à propos des mécanismes
du cerveau ont enregistré des résultats spectaculaires2. Ils cassent
en tout cas tout reste de dualisme corps/esprit, tout dualisme
entre les cellules du cerveau et le cerveau comme siège d’un esprit ou
d’un sujet libre.
À propos du cerveau, on peut distinguer un plan anatomique : qui
se rapporte aux connexions et réseaux neuronaux (ordre de grandeur
: cent milliards de neurones) ; un plan physiologique qui concerne
l’activité électrique et les signaux chimiques circulant dans le
2. Cf., par exemple, Jean-Pierre CHANGEUX, L’homme neuronal, Paris,
Fayard, 1991 (1983). Pour un débat touchant les questions que cela pose
quant à la compréhension qu’un humain peut avoir de lui-même : Jean-Pierre
CHANGEUX et Paul RICOEUR, Ce qui nous fait penser. La nature et la règle,
Paris, Odile Jacob, 1998.
20 PIERRE GISEL
cerveau ; un plan comportemental qui permet de soutenir que le cerveau
fonctionne de façon projective, faisant des hypothèses sur le
monde et les mettant à l’épreuve. Notons que l’ensemble du fonctionnement
fait l’objet d’expériences minutieuses. On peut mentionner,
d’abord, les lésions partielles et l’observation systématique et différenciée
des dysfonctionnements qui y sont liés ; ils touchent la parole,
la perception sensorielle, la planification des actions, la perturbation
de l’image de soi, le rapport à autrui. Signalons aussi l’imagerie cérébrale,
qui permet d’établir expérimentalement une distribution différentielle
des activités électriques et chimiques des territoires cérébraux,
en lien avec de la souffrance (réelle ou imaginée) ou des états
dépressifs, schizophréniques ou hallucinatoires. On ajoutera les expérimentations
électrophysiologiques en rapport avec l’activité des neurones,
faisant voir des liens entre une activité neuronale et ce qui est
vécu subjectivement.
Tout cela conduit à une inscription assez radicale des faits psychiques
dans l’ordre de la nature ou de la matière. Si, comme le rappelle
le philosophe Paul Ricoeur, on ne peut pas dire, en rigueur, que le cerveau
pense (penser suppose la conscience, réflexive, d’un sujet), on
doit au moins admettre que lorsque je pense, il se passe quelque chose
dans mon cerveau.
Au total, le cerveau est complexe : fait d’entités distinctes, en rapport
non selon continuité de circulation, mais par communications
discontinues (des synapses : cent mille contacts discontinus par neurone,
un demi-milliard par centimètre cube, soit un nombre de combinaisons
quasi-infinies). Il est hiérarchisé : il enregistre et analyse
l’information par plusieurs voies parallèles, d’où une activité de synthèse.
Il développe enfin une activité spontanée : il est projectif, avec
ce que cela suppose de construction et d’organisation. On peut aussi
observer que ce qui concerne le rapport à l’autre, rapport d’empathie
ou de sympathie, se joue au niveau du cortex frontal, la partie évolutivement
la plus récente.
Dans l’histoire de la vie, les modifications internes au cerveau prennent
le relais de l’évolution des espèces. S’en trouve constitué un appareil
en interaction avec un environnement non seulement physique,
mais aussi social et culturel. Concrètement, le petit d’homme, dont le
cerveau est encore incomplètement stable, passe par un apprentissage.
Une mémoire est ici à l’oeuvre, une mémoire primaire ou immédiate,
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 21
mémoire de travail présente, et une mémoire secondaire, inconsciente,
qui apparaît maintenue en ligne pendant le travail de la première ; et
qui est lourde, notamment, de composantes émotionnelles.
Dans nos gènes et nos cellules sont largement inscrits des héritages
qui remontent aux origines de la vie. Avec l’homme, une évolution
génétique laissée en suspens apparaît prolongée sur un mode non
génétique (social et culturel) : le socialement approprié trouve son inscription
dans le cerveau. L’auto-organisation du vivant, ici via le cerveau,
continue à se faire dans un jeu avec le milieu, sur une base
matérielle ayant intégré des mémoires de longue durée.
Partir en quête de nos commencements, c’est se retrouver face à
un horizon on ne peut plus grand, avec tout ce que cela représente
d’énigme : un quasi-infini s’ouvre à nous, qui nous dépasse. Mais,
comme en écho, cet infiniment grand renvoie à l’infiniment petit sans
lequel rien ne serait : l’univers s’est mis en branle parce que des particules
élémentaires se sont assemblées pour passer par différents stades,
selon un processus qui se poursuit de façon exponentielle, créant
de nouvelles structures de plus en plus complexes, accueillant la vie et
lui permettant de se déployer.
Mutatis mutandis, on pourrait ici faire écho à Pascal qui, dans les
Pensées3, s’émerveille devant l’infiniment grand et l’infiniment petit
entre lesquels prend place l’humain. Un infiniment grand et un infiniment
petit qui, par ailleurs, semblent pour ainsi dire renvoyer à un fait
de différence inscrit au coeur de l’évolution, comme donné en creux :
l’histoire de l’univers est faite de différenciations, de complexifications,
de spécifications, et la vie suppose la différence.
Il convient de souligner encore l’irréversibilité de l’évolution, à
l’encontre de toute illusion de retour à un état initial : telle une spirale,
l’évolution se déploie et se construit dans le temps et dans l’espace,
montrant combien la vie — et donc aussi celle de l’homme — est insérée
dans le processus d’un développement qui aurait pu être autre
mais qu’on ne peut plus déconstruire. Pour anticiper, on peut dire que
l’humain est inscrit en contingence — des données de fait —, il prend
place dans un monde dont il hérite et qui le dépasse.
3. Pensée 72 selon la numérotation de l’édition de Brunschvicg, 199 selon
celle de Lafuma.
22 PIERRE GISEL
Remarquons enfin que si le discours scientifique s’inscrit dans
l’ordre du vérifiable, du démontrable, de ce qui relève d’hypothèses et
de lois mathématiques que les découvertes viennent confirmer ou mettre
en cause, il n’en demeure pas moins que, sur certains points, ce discours
relève d’extrapolations : les preuves et les vérifications ne sont
pas toujours possibles. Surtout, chaque représentation ne peut se construire
et chaque loi énoncée ne peut avoir validité qu’à partir et en fonction
d’un commencement de l’univers déjà donné. L’astrophysicien
Marc Lachièze-Rey le souligne : « Le processus fondateur de l’Univers,
s’il en existe un, n’a pu se dérouler dans le cadre de l’Univers puisqu’il
a abouti, précisément, à créer ce cadre. [...] la physique ne peut concevoir
ce qui aurait pu se dérouler avant, que cet avant soit chronologique
[...] ou fondateur, explicatif [...]. Un “autre univers” — par définition
— ne pourrait avoir aucune interaction avec le nôtre. Sinon, il ferait
partie du nôtre »4. La science dit beaucoup de choses sur l’univers ; elle
ne peut en dire le dehors, pour autant, justement, que cela ait un sens.
2. Aperçu de données bibliques et chrétiennes
2.1 Des cosmologies changeantes
Chacun sait que la Bible présente, en son début, deux récits de création.
La description des commencements et les représentations cosmologiques
qu’ils suggèrent diffèrent. Ces deux textes ne viennent
d’ailleurs pas de la même époque, et le second qui s’offre à la lecture,
dans l’ordre biblique reçu, va chronologiquement avant celui qui le
précède dans le texte final.
Dans le même ensemble biblique, on peut lire des textes qui offrent
d’autres images encore du commencement du monde et de ce qui lui
assure stabilité. Ainsi, en est-il du Ps 104,5 avec la représentation de
fondements, voire de colonnes, sur lesquels reposerait la terre (Dieu a
« établi la terre sur ses fondements ») ou, de Job 38, 4-6, Dieu
interroge : « Où étais-tu quand je fondais la terre ? [...] Qui en a fixé les
mesures, le sais-tu ? [...] Dans quoi ses bases sont-elles enfoncées ? »),
ou encore la mention d’un « sein maternel » (Job 38, 8 et 16 : « Qui a
fermé la mer avec des portes, quand elle s’élança et sortit du sein
4. Marc LACHIÈZE-REY, « Les origines », dans Recherches de science
religieuse 81 (1993), p. 539-557, ici : p. 546s.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 23
maternel ? [...] Es-tu parvenu jusqu’aux sources de la mer ? T’es-tu promené
dans les profondeurs de l’abîme ? »).
En termes de représentations toujours, on a pu parler de combat
originel et créateur entre Dieu et des forces hostiles ou au contraire d’un
acte décisivement souverain de Dieu, par delà toute mesure humaine ou
terrestre, avec, parfois, des figures médiatrices proches de Dieu.
Pour le premier registre, on lira notamment les Psaumes, 74, 12-
14 : « Dieu, tu es mon roi dès l’origine, auteur des victoires au milieu de
la terre. C’est toi qui as cassé par ta force la mer, tu as brisé les têtes du
dragon sur les eaux. C’est toi qui as fracassé les têtes de Léviathan, tu
l’as donné à manger au peuple des bêtes sauvages » ; ou 89, 11 : « C’est
toi qui as écrasé Rahab, comme un cadavre percé de coups » (selon
d’autres représentations, c’est Dieu qui a formé le Léviathan « pour
jouer avec lui », 104, 26 ; cf. aussi Job 40, 15 et 25).
Pour le second registre, on peut renvoyer à Ésaïe 40, 12-18 : « Qui
a mesuré les eaux dans le creux de sa main, fixé les dimensions des
cieux avec la paume, celle de toute la poussière de la terre dans un tiers
de mesure ? [...] Qui a fixé une mesure à l’esprit de l’Éternel [...] ? [...]
À qui voulez-vous comparer Dieu ? » (cf. aussi Job 11, 7-9) ; 44, 24 :
« Ainsi parle l’Éternel qui te rachète, celui qui t’a façonné dès ta
naissance : “Moi, l’Éternel, je fais toutes choses, seul je déploie les
cieux, de moi-même j’étends la terre” » ; enfin 45, 7 : « Je forme la
lumière et je crée les ténèbres », voire le « malheur » (cf. 54, 16).
Quant aux figures médiatrices proches de Dieu, accompagnant
plutôt le second registre — comme si se conjugaient une création cosmique
hors mesure humaine et un principe secret qui la recueille de
l’intérieur pour en faire une création pour la vie —, on mentionnera
tout spécialement la Sagesse, « artisane » de la création (Sagesse 7, 22
et 8, 6) et proche de Dieu (9, 9 : « Près de toi se tient la Sagesse qui
connaît tes oeuvres, et qui était présente lorsque tu créais le monde »).
La même Sagesse précédant la création et présidant à la création se
trouve en Proverbes 8, 22-31 : « J’ai été établie depuis l’éternité, dès
le commencement, avant l’origine de la terre. J’ai été enfantée quand
il n’y avait point d’abîmes [...]. Lorsqu’Il disposa les cieux, j’étais là ;
[...] j’étais à l’oeuvre auprès de lui, et je faisais de jour en jour ses délices,
jouant devant lui tout le temps », ou en Siracide 24, 1-22 :
Je suis sortie de la bouche du Très-Haut et comme une vapeur j’ai recouvert
la terre. J’habitais dans les hauteurs du ciel et mon trône reposait
24 PIERRE GISEL
sur la colonne de nuée. Le cercle du ciel, je l’ai parcouru, moi seule, et
j’ai marché dans la profondeur des abîmes. [...] Avant que le temps ne
commence, il m’a créée, et pour les siècles je ne cesserai pas d’exister. [...]
Venez à moi, vous qui me désirez, et rassasiez-vous de mes fruits.
Un motif analogue et une structure semblable se retrouvent dans
le Nouveau Testament, à propos du Christ cette fois, en Colossiens 1,
15ss. : « Il est l’image du Dieu invisible, le premier-né de toute la création.
Car en lui tout a été créé dans les cieux et sur la terre, ce qui est
visible et ce qui est invisible, trônes, souverainetés, principautés, pouvoirs.
Tout a été créé par lui et pour lui. Il est avant toutes choses, et
tout subsiste en lui », ou Éphésiens 1, 4-10 : « En lui, Dieu nous a élus
avant la fondation du monde [...]. Il nous a fait connaître le mystère
de sa volonté [...] : réunir sous un seul chef, le Christ, tout ce qui est
dans les cieux et ce qui est sur la terre », ou encore Hébreux 1,2 :
« C’est par lui [le Fils] qu’il a fait les mondes » et Jean 1, 1-4 : « Au
commencement était la Parole [...]. Tout a été fait par elle, et rien de
ce qui a été fait n’a été fait sans elle ». Rappelons que la littérature
rabbinique soutient que Dieu regarda la Tora pour savoir comment
créer le monde : même dispositif, qui voit le moment central et structurant
de l’histoire être placé au coeur même de l’origine du monde.
Quant à la réception de la Bible que sanctionnent les théologies
chrétiennes, elle suppose elle aussi, au cours du temps, des représentations
changeantes, que l’arrière-fond soit plus stoïcien (avec la consécration
chrétienne d’une loi naturelle), néo-platonicien (avec ses
reprises dans l’anagogie ou la mystique chrétienne), aristotélicien
(avec les différenciations internes de l’être qui l’accompagnent, ainsi
que des topologies et divers ordonnancements de qualités essentielles)
ou, à l’aube des Temps modernes, celui de lois mathématisables et de
systèmes mécaniques (pouvant générer diverses théodicées), celui
d’une nature sans mystère intrinsèque (lié à un Dieu cause directe ou,
au contraire, inconnu et autre), voire, plus récemment, celui d’une
nature faite d’énergies et d’un devenir dont Dieu pourrait être partie
prenante, ou tout au moins partie impliquée.
On le pressent, si la théologie chrétienne se comprend à la fois
comme tradition — et non suite discontinue de représentations diverses
— et entend se référer à des Écritures antérieures qu’elle reçoit
comme fondement, malgré leur diversité interne, il faut qu’elle ait
opéré quelque déplacement. Elle aura notamment dissocié la question
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 25
de la vérité de celle des représentations du monde, de l’humain et de
Dieu au travers desquelles s’exprime cette vérité : la vérité est dite à
travers des représentations (il n’y a pas en ces matières de vérité pensable
hors représentations supposées, même si les deux ordres sont
distincts), mais sans faire nombre avec elles (la vérité ne s’y résorbe
pas, ni ne s’y épuise pas). Traversant et assumant une diversité de
représentations cosmologiques, renvoyant à une Bible qui a ellemême
consacré une telle diversité, la théologie chrétienne ne peut que
révéler une vérité sur soi, sur le monde et sur Dieu qui soit seconde par
rapport aux stricts énoncés, renvoyant dès lors à un absolu (la vérité
de Dieu) ou un non-lié (c’est l’étymologie du mot : absolu) qui ne fait
pas nombre avec le temps, l’espace ou l’être du monde.
La vérité sur Dieu et sur l’humain n’est donc pas ici liée à des
« contenus », mais peut-être à des postures, des manières de se poser
dans l’être, ou de se poser par rapport à soi et à l’altérité, des manières
de se rapporter et d’être rapporté à soi et à l’altérité (le monde et Dieu,
les dieux ou l’absence de dieu[x]).
Nous allons maintenant rassembler les principales données des
Écritures bibliques et de l’histoire doctrinale chrétienne touchant
notre thématique, en faisant état des représentations sanctionnées ou
proposées, tout en supposant déjà, dans la mise en place, la dissociation
qu’on vient d’évoquer entre « contenu » et posture engagée.
2.2 Données bibliques
La perspective mise en scène au plan biblique dit la consistance propre
et l’autonomie du monde et du réel. La création apparaît irréductible à
Dieu, tout en étant dite bonne et bénie : elle en vient, certes, mais selon
une constitution qui est fonction d’une différence originaire et déterminante,
non selon une génération par exemple, fût-ce par diversification
(différente de Dieu, la création est d’emblée globale et structurée). Elle
apparaît également irréductible à l’humain : elle le précède en tout point,
et l’humain la reçoit venue d’ailleurs et déjà formée : il ne l’invente ni
n’en poursuit le processus, mais en répond et s’inscrit dans sa différence,
pour le meilleur ou pour le pire, pour la vie ou pour la mort ; en ce sens,
on peut parler du monde comme « tiers » entre l’humain et Dieu
(comme d’ailleurs entre l’humain et l’humain, soi ou autrui).
L’origine du monde est ici, stricto sensu, inconnue (elle peut être
pensée, évoquée, mais non décrite), elle est autre et interdite : la créatheo_
26 PIERRE GISEL
tion vient de Dieu (elle est ex nihilo dira-t-on ultérieurement, dans des
registres différents), et elle est rapportée au tranché d’une Parole, non
à une homogénéité d’être ou d’essence. Du coup — c’est en effet lié —,
l’humain reçoit la création comme donné déjà cultivé, structuré par la
Loi (mythologiquement : l’arbre du milieu du jardin) et traversé de la
réalité du mal (le serpent), hors de toute linéarité de provenance et
d’advenir.
Si la différence — non la continuité ou l’homogénéité — est ici originaire,
ce n’est pas du fait d’une imperfection (ou, pire, d’un péché) ;
la différence joue au contraire comme pivot, décisif, au coeur tant de
ma réception du monde comme création (voir la mise en scène d’Adam
en Gn 2-3) que de la dramatique croyante elle-même (voir, en christianisme,
la dénonciation d’une hypostase de la loi, à laquelle on s’assimile,
dans la mise en scène de Jésus face aux Pharisiens et la reprise par
Paul du même motif à partir de la croix). Ainsi originaire, la différence
est, potentiellement ou au titre d’une condition requise, fructueuse.
Pour une théologie s’efforçant de reprendre une telle mise en place
des positions et des enjeux, renvoyer à Dieu ne devrait dès lors pas être
au principe d’une totalisation, au regard du monde, sa réalité profane
et extérieure, ni non plus au regard des réalités de la foi, aussi bien
l’Église et ses données symboliques propres, son ordre d’appartenance
et de représentations, que le fait du croire comme tel5.
C’est dire que, pour une telle théologie toujours, le monde donné
est d’abord contingence : le monde est donné en dehors de toute
immédiateté de l’humain et du principe dont il vit, son origine et sa
vérité. Un monde comme contingence donnée — comprenant
l’énigme d’un mal originaire — en appelle, en matière de vérité dernière
ou de Dieu, non à une logique de continuité et de synthèse organisatrice,
mais à une logique du surcroît ou de l’excès. À mon sens, se
dessine alors, pour l’humain, la dramatique d'une réponse qui va se
décider, théologiquement et spirituellement, « devant Dieu », mais
qui se joue, concrètement, au travers de la manière dont l’humain
répond du monde donné. L’humain répond moins à Dieu, directement,
qu’il ne répond de la manière dont il se pose dans le monde, de
5. Pour plus de développements sur ce point, cf. mon L'Excès du croire.
Expérience du monde et accès à soi, Paris, Desclée de Brouwer, 1990.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 27
la manière dont il reçoit la création ou de la manière qu’il a de s’en
croire l’origine et le maître, le connaisseur et le possesseur (« être
comme des dieux » soufflait le serpent à Adam ou « transforme les
pierres en pains »6, dit Satan à Jésus typé comme nouvel Adam).
Notons que c’est au coeur d’un monde qui le précède et le dépasse
que l’humain — homme et femme — est dit « image de Dieu ». Le lien
à Dieu n’est en effet pas à chercher aux confins (avec les dérivations
ou les marches d’approche que cela peut supposer ou entraîner), pas
plus du côté d’un premier « commencement » (sur ce point, le monde
est ex nihilo) que du côté d’un terme « dernier » (le monde passe et est
destiné au néant).
Si le rapport à Dieu se noue au coeur du monde, à son propos et
au gré d’une reprise assumée en responsabilité singulière — en régime
incarné et personnel —, se marque alors, sur le pôle de l'humain également
un excès (un manque aussi : l’homme a à être) qui renvoie à ce
Dieu origine et fin, lui-même en excès (en absence aussi : Dieu a ici à
être révélé). Cet excès auquel l’humain est assigné répond, en son
ordre, à l’excès qu’est Dieu, tant au lieu de l’origine, en discontinuité
avec les logiques de la nature (l’énigme du mal s’y loge), qu’au lieu de
la fin, également en discontinuité avec les logiques de la nature et de
l’histoire (les renversements de type apocalyptiques s’y insèrent).
C’est pourquoi la thématique du croire est irréductible, avec ses promesses
et ses perversions ; mais elle se greffe directement sur ce qu’est
l’existence même, au présent : elle en radicalise l’enjeu et les cristallisations
concrètes effectives.
Précisons enfin que parce que le monde ne fait nombre ni avec ce qui
peut être confessé comme vérité première et dernière (la vérité de Dieu),
ni avec l’humain (toujours singulier), l’avènement d’existence qui s’y inscrit
prend corps dans un espace ouvert et une irréductible pluralité. De
même, le réel se donne là sur un horizon universel, tout aussi irréductible
aux particularités de chacun (ce déploiement pluriel et cet horizon universel
donnent consistance concrète à l’autonomie de la création).
Globalement, la Bible chrétienne raconte une longue histoire, focalisée
sur les relations entre des hommes et leur Dieu, historiquement
6. On aura remarqué que la tentation — profonde ou spirituelle — n’a pas
ici la forme d’une action éthiquement répréhensible...
28 PIERRE GISEL
traversée de ruptures et de reprises, d’exil et de retour, de loi et d’appel
prophétique, d’accomplissements, de transgressions et de relances, de
bénédictions secrètes et d’imprévus. Or, cette histoire est encadrée de
textes disant, en amont, une origine radicale, différente de l’élection et
de ses suites, et, en aval, une fin elle aussi radicale et différente de l’histoire
des croyants et de ce qui s’y joue. Prêtons-y attention : le patriarche
ancêtre du peuple (juif) ou le « père des croyants » (chrétien),
Abraham, n’est pas le premier homme, Adam. Et le Messie reconnu en
Jésus n’ouvre pas directement ni sans rupture l’achèvement final (le
« Royaume ») : c’est un Messie crucifié au coeur du monde et aux prises
avec une histoire d’hommes. On dit ici un accomplissement, certes,
mais il échappe à l’histoire visible (il est dit dans la foi) : le « Royaume »
n’est pas là, et l’histoire n’y conduit pas naturellement, ni linéairement.
Il est foncièrement d’un autre ordre. Comme symétriquement, en
amont, la création du monde est d’un autre ordre que l’histoire qui va
s’y déployer.
Bibliquement, l’histoire du monde et des hommes est encadrée par
des récits d’origine et de fin qui ne lui sont pas linéairement accrochés,
ni ne lui sont homogènes. Ils évoquent, en forme d’images (mythes et
apocalypses), des données d’un autre ordre et qui sanctionnent une
discontinuité : une origine vers laquelle on ne saurait remonter, ni soi
ni l’histoire des hommes, et une fin ou un accomplissement qu’on ne
saurait toucher ou réaliser, ni soi ni l’histoire des hommes.
Vus sous un certain angle, les deux textes de Genèse 1 et de
Genèse 2-3 peuvent faire doublet. Leur articulation dans le texte
biblique d’ensemble dit néanmoins encore autre chose que la texture
propre à chacun. Elle fait que se présente d’abord un cadre cosmique
(Gn 1), suspendu à Dieu et achevé en son ordre : les sept jours, sanctionnés
par le sabbat où Dieu se « repose », avec, au centre de cette
fresque originaire et achevée en son ordre, une place marquée pour
l’homme, une place centrale et cadrée justement. Décroché, hors de
la continuité d’un déroulement descriptif ou narratif, vient ensuite le
second texte (Gn 2-3), non plus la présentation d’un cadre cosmique
originaire, mais le récit d’une genèse de l’humain, au coeur d’un jardin
déjà planté, la genèse d’un humain sollicité par un mal, le serpent,
dont on ne sait pas d’où il peut bien venir (il ne vient pas en
tout cas tel quel de la fresque de Gn 1, de la création bonne et bénie
de Dieu).
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 29
Entre les deux récits, il y a, dans l’ordre biblique reçu, hiatus. C’est
que se tiennent, au lieu de l’origine, deux types de données. L’une est
de frappe cosmique, sans événement à proprement parler. C’est une
donnée matricielle, celle des éléments du monde, ici différenciés. Et il
y a une autre donnée, celle d’une effectuation de l’humain au coeur du
monde, de frappe historique, même si c’est d’un temps immémorial
ou paradigmatique. À côté d’une matrice faite des éléments du
monde, un moment généalogique est ainsi inscrit dans l’originaire.
L’humain — chacun d’entre nous — est précédé d’une donne cosmique,
mais il est aussi précédé, sur un autre plan, d’une histoire
d’engendrement qui laisse une trace. L’une et l’autre sont par-delà ma
mémoire, mais c’est en fonction de l’une comme de l’autre, enfouies
tout en étant bien là, que je peux naître à moi-même, dans le temps,
en fragilité, exposé aux autres, mal assuré, tenté ou investi de divers
vertiges, et accompagné ou surplombé d’une promesse à habiter.
2.3 Éléments de la réception historique chrétienne
L’Antiquité tardive — véritable matrice de notre civilisation occidentale
— a fait l’objet de nombreuses propositions de salut (gnoses
diverses, dont les manichéismes ; reprises des mystères ou de
l’orphisme ; culte de Mithra ; etc.). Le christianisme fut l’une d’elles.
Mais il prit sa forme propre et ses caractéristiques en cristallisant et en
pensant une proposition de salut qui, loin de déserter, de nier ou de
disqualifier l’ordre de la création (la réalité des choses, dans leur consistance
propre et sous un horizon commun à tous, « universel »), s’y
articule au contraire, intrinsèquement.
En lien avec la compréhension d’un salut articulé à la création, le
christianisme s’est battu ici pour une conception spécifique de Dieu.
Dieu y est compris comme extérieur au monde et non (à l’instar des
dieux de certaines mythologies) comme le doublet de ses chatoiements
enchanteurs et multiples, mais sans que cela conduise à une dévalorisation
du réel et de l’humain (pour laquelle serait seul vrai ce qui
relève d’un spirituel au-delà de l’être). En d’autres termes, Dieu et le
monde sont différents, mais ont tous deux valeur et importance, dans
leur ordre propre à chaque fois. Le Dieu chrétien est origine première
et dernière, mais il se tient au principe d’une création qui advient sous
une figure à la fois finie et éminente, ou selon une structuration singulière
de l’étendue spatiale et du flux temporel.
30 PIERRE GISEL
À l’encontre de bien des gnoses, le christianisme ne renvoie pas la
matière — ni le temps, ni le corps — à un principe mauvais, le salut
étant seul rapporté à un principe bon. Mais il met en avant l’ordre
d’un mystère, différencié : le mystère d’une intrigue inscrite au coeur
de la création, celle d’une liberté couplée à une séduction d’infini, malheureuse,
et promise à une subversion possible, pour le meilleur.
Dieu a ici statut de gratuité. Il n’est ni lié au monde, ni nécessaire ;
il est fait d’une surabondance. Il est d’un autre ordre, d’un autre espace
et d’un autre temps (ou autre que l’espace et que le temps, le temps et la
création étant inhérents l’un à l’autre). Dieu relève d’une asymétrie, mais
il peut — ou peut justement — se tenir au coeur de tous nos présents.
Décroché du monde et de ses lois naturelles, il est au principe d’un surplus.
Saint Augustin dira Dieu radicalement transcendant (« plus haut
que ce qui est le plus haut ») tout en étant radicalement immanent
(« plus intime que ce qui m’est le plus intime », Confessions III, VI, 11).
Entre Dieu et la création, entre Dieu et l’humain, il n’y a pas
d’arrière-plan homogène, pas de coordonnées ni de mesures communes.
Le christianisme ne suppose ni ne conduit à un monolithisme ; de même
qu’il coupe avec tout aménagement, plus ou moins équilibré, de forces
dualistes. Il dit un Dieu autre, un Dieu qui n’est pas la forme vraie des
choses, ni la plus achevée, ni leur somme, potentielle ou cachée. Classiquement,
Dieu est amour (non confiscable) et grâce (imprévisible).
Lorsque au Moyen Âge, Thomas d’Aquin — un penseur typique
et qui fera ultérieurement figure de référence emblématique, en régime
catholique surtout — use du mot « être », ce n’est pas au sens, neutre,
de ce qui est simplement là et peut être disposé devant nous (ce qui est
dans l’espace ou y prend place, comme le penseront les premiers philosophes
de la modernité7, ou ce que les philosophes appellent techniquement
les « étants »). Au contraire, par « être », et à propos de la
création, Thomas entend toujours, dès l’abord, une réalité qui a forme
et qualité, qui présente une complexité et qui vit de relation.
Par « être » — l’être posé par Dieu ou rapporté à Dieu —, on
entend, dans la synthèse proposée par Thomas d’Aquin au coeur du
Moyen Âge, un donné, fini et éminent, qui, dit techniquement,
7. « Ce qui est étendu » (res extensa), dit Descartes dans la première partie
du XVIIe siècle.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 31
« existe » ou est « en acte ». N’a ici d’être au sens fort — devant Dieu,
pour Dieu ou selon Dieu — que ce qui relève d’un ordre relationnel
justement : ce qui reçoit l’exister et, à partir de là, se reprend sur soi.
La création est relation, relation de grâce et non de nécessité, une relation
inscrite, à titre constitutif, dans le fait d’exister.
En cela, la « cause » de l’être qu’est Dieu — Dieu comme origine
de l’être — n’est pas le premier terme d’une série qui s’ensuit, mais une
réalité transcendante, autre, au principe d’une relation, fragile (en
« disproportion » dit la tradition), prenant corps au coeur du donné,
pour le faire être : le faire exister ou être ce qui lui est donné d’être.
Une objectivation du monde fonctionnant selon des lois universelles
et une compréhension de la cause première comme premier
commencement (un Dieu premier horloger ou donnant une chiquenaude
initiale) constituent l’arrière-fond sur lequel les théodicées vont
voir le jour. Cet arrière-fond est aussi celui de ce qu’on appelle, couramment,
la théologie naturelle. Or, son affirmation ou son refus me
semblent dessiner la constellation des débats dans lesquels se meuvent
la théologie et la foi chrétiennes depuis environ un siècle et demi.
La théologie naturelle a été sanctionnée au Concile de Vatican I
dans sa Constitution Dei Filius (1870). Parmi ses citations les plus
nettes, notons : « Dieu, principe et fin de toutes choses, peut être
connu avec certitude par la lumière naturelle de la raison humaine à
partir des choses créées » (chap. 2). Se reprend ici, pour le Concile, ce
qui relève de la théologie de la création. La révélation n’y a pas de pertinence.
Le Concile entend répondre au rationalisme, mais sur son terrain,
sans déplacement des termes. La déclaration citée se situe sur le
plan de l’objectivité telle que l’entend spontanément l’homme
moderne, même s’il s’agit d’une objectivité où, bien sûr, l’Église ne
voit pas les choses de la même manière que les scientifiques. Il y a
conflit8, mais chacun est au même niveau.
En effet si ce qui relève de la thématique de la création se joue
dorénavant dans les termes qu’on vient de souligner, la révélation relèvera
de données supplémentaires, celles — c’est sans surprise — du
8. Canon 2, 1 : « Si quelqu’un dit que le Dieu unique et véritable, notre
Créateur et Seigneur, ne peut être connu avec certitude par ses oeuvres grâce
à la lumière naturelle de la raison humaine, qu’il soit anathème ».
32 PIERRE GISEL
salut et de l’Église : « Outre les vérités que la raison naturelle peut
atteindre, nous sont proposés à croire les mystères cachés en Dieu, qui
ne peuvent être connus s’ils ne sont divinement révélés » (chap. 4). On
se trouve ici à l’opposé de toute objectivité et de toute raison. Concernant
ces vérités qui ne sont plus celles de Dieu comme Créateur, mais
de ce qui s’ajoute et réclame révélation, spécifique et hors raison, le
Concile doit mettre les points sur les i : « Nous croyons vraies les choses
qu’il nous a révélées, non pas à cause de leur vérité intrinsèque perçue
par la lumière naturelle de la raison, mais à cause de l’autorité de
Dieu ». Le fondement est celui d’une pure intervention extérieure. En
toute logique est dès lors requise, « la soumission plénière de notre
intelligence et de notre volonté » (chap.3).
À la même époque, des théologiens protestants libéraux élaboraient
aussi ce qui peut passer pour une théologie naturelle (ou qui
peut jouer une fonction analogue), mais selon d’autres coordonnées,
à partir de la psychologie par exemple ou d’une anthropologie religieuse.
Les registres sont alors ceux de l’homme et de son déploiement
historique et social. A l’opposé, des courants franchement conservateurs,
néo-calvinistes par exemple, pourraient fournir des parallèles
protestants très nets à ce qui se cristallise à Vatican I.
Après la cassure culturelle qu’a représentée la Première Guerre mondiale,
le XXe siècle a pris, majoritairement, le contre-pied de la théologie
naturelle qu’on vient d’évoquer. D’abord et surtout en terrain protestant,
mais ensuite suivi, avec des nuances, par bien des théologiens catholiques.
Avec des hommes comme Karl Barth ou Rudolf Bultmann — mais
ils expriment une tendance ecclésiale et culturelle dominante —, c’est
délibérément un motif de la révélation transcrit en termes d’interpellation
et de « kérygme » qui vient au centre, reprenant non la thématique
de la création, mais celle du salut : du péché (compris comme
auto-enfermement) et de la grâce (entendue comme irruption d’altérité
et de transcendance).
La théologie de la création passe alors à l’arrière-plan. Elle se
trouve soit abandonnée, soit comprise comme le prolongement, par
extension, de l’expérience d’une libération, expérience seule fondatrice,
mais intra-historique justement et non située aux commencements.
De l’expérience d’un Dieu libérateur lors de la sortie d’Égypte,
on serait passé à la confession que ce Dieu est maître de tout l’univers,
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 33
comme du mystère pascal on aurait été conduit à une confession plaçant
le Christ au coeur du mystère de la création globale. C’est ainsi
que les exégètes lisent alors la Bible (Gerhard von Rad pour l’Ancien
Testament par exemple). Quant à Barth, il comprend la création
comme « alliance » (Dogmatique, début de la partie III, § 41).
La force de cette réaction ne doit pas être négligée. C’est le refus
d’entendre la création comme cadre extérieur, quasi neutralisé, et la
volonté de retrouver une problématique franchement théologique et
croyante qui, comme telle, se laisse toujours à nouveau instruire par
les mystères du salut (le mystère pascal, la christologie, les sacrements,
l’expérience de foi). La construction de Barth est ici, encore une fois,
explicite : elle met délibérément en correspondance salut et création,
au titre d’une « alliance interne » et d’une « alliance externe » qui
renvoient l’une à l’autre.
Qu’il y ait là une opposition nette à l’égard du propos de Vatican I
mis en exergue, tous en sont conscients. L’expression « théologie
naturelle » est d’ailleurs devenue une valeur péjorative et discriminante
chez la majorité des théologiens et pasteurs de plusieurs générations.
Quant à Barth lui-même, il a expressément déclaré que la théologie
naturelle n’était « pas une des nombreuses hérésies possibles, mais
l’hérésie par excellence »9, une déclaration qu’on peut rapprocher d’une
autre de ses affirmations célèbres : si l’« on ne peut pas devenir
catholique », ce n’est pas à cause du pape, de Marie ou de « toutes les
autres raisons qu’on peut avoir », mais à cause de « l’analogie de l’être »
(la ressemblance entre le créé et le créateur qui permettrait de remonter
du premier au second) qui est une « invention de l’Antéchrist »10.
L’opposition est nette. J’entends néanmoins la dépasser. J’ai critiqué
la position cristallisée à Vatican I et signalé le bien-fondé de la
réaction qui en prend le contre-pied. Il reste à dire en quoi cette réaction
ne me paraît pas satisfaisante.
Soulignons d’abord que la faiblesse vient justement de ce qu’il s’agit
là, en bonne partie, d’une réaction, avec ce que cela peut entraîner de
polarisation et d’unilatéralité. S’abandonnant au désir — légitime —
d’articuler création et salut (ou création et christologie), on a perdu de
9. Dogmatique II/1* , Genève, Labor et Fides, 1956 (1940), p. 140.
10. Ibid., I/1*, 1953 (1932), p. XII.
34 PIERRE GISEL
vue ce qui pouvait constituer les traits spécifiques et la nécessité de la
thématique de la création. On a oublié en quoi elle n’est pas qu’un doublet
ou qu’une simple extension du motif du salut (de la libération ou
de la christologie), mais un aspect irréductible, pouvant apporter des
correctifs à une confession du salut prise pour elle-même, détachée de
la thématique de la création. De même réciproquement, le motif du
salut peut apporter des correctifs à ce que proposerait une thématique
de la création indûment autonomisée ou rationalisée.
La tâche est claire. C’est celle de notre génération. Elle correspond
en outre à une demande culturelle et sociale (et, à mes yeux, à une
nécessité ecclésiale). Il s’agit de rien de moins que de dépasser l’opposition
signalée et de retravailler chacun des deux termes qui se font
face : mettre donc en perspective et problématiser ce qui est central
dans la vision chrétienne de la création d’une part, ne pas s’installer
dans une focalisation sur le seul moment du salut de l’autre. Et c’est,
du coup, renouer avec la confrontation, difficile mais nécessaire et
fructueuse, de la foi et de la raison (une confrontation que la théologie
dominante du XXe siècle a souvent abandonnée) ; par-delà — les
points sont liés ou sont les différentes faces d’une même donnée
d’ensemble — c’est renouer avec une théologie qui sache mieux penser
et faire valoir sa pertinence dans la société globale et face à ses
interrogations. On l’esquissera dans le point 5.
3. Une proposition de balisage théologique
Entre les affirmations de la science sur les commencements et la consistance
ou les structurations de l’univers, de la vie et de l’humain d’une part,
et celles de la Bible — comme celles d’autres traditions religieuses d’ailleurs
—, d’autre part, il y a un net hiatus. On aurait tort de le sous-estimer. Ce
hiatus atteint les représentations, les descriptions ou les narrations11 qu’on
11. On notera que la forme narrative n’est pas propre aux seuls discours
religieux, cf. Hubert REEVES, Patience dans l'azur. L’évolution cosmique,
Paris, Seuil, 1981 ; ID., Dernières nouvelles du cosmos, Paris, Seuil : t. I : Vers
la première seconde, 1994 et t. II : La première seconde, 1995 ; Stephen
HAWKING, Une brève histoire du temps. Du big-bang aux trous noirs (1988),
Paris Flammarion, 1989 ; Jean HEIDMANN, L’odyssée cosmique. Quel destin
pour l’Univers ? Paris, Denoël, 1986 ; plus ancien, Carl Friedrich von
WEIZAECKER, Die Geschichte der Natur, Zürich, Hirzel, 1948.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 35
peut donner des commencements et des structurations. Ce n’est pas
rien. Cela pourrait certes être relativisé et dépassé : les représentations
cosmologiques ne sont ni homogènes ni constantes, dans la Bible
comme dans la tradition théologique chrétienne. Mais l’écart entre le
discours scientifique et discours de foi est en réalité plus irréductible :
il affecte la place de l’humain dans le monde (centrale et spécifique
dans la tradition biblique et théologique, tardive, dérivée et sans autonomie
pour la science) et, du coup, son rapport possible avec un Dieu
créateur du monde (déterminant pour la même tradition biblique et
théologique, sans assignation dicible ni pensable pour la science).
Dans les milieux théologiques et ecclésiaux — hors dogmatisation
catholique indûe ou fondamentalisme protestant —, on parle souvent
de complémentarité entre discours scientifiques et discours de foi12. A
mon sens, un tel projet n’est pas à récuser comme tel. Mon questionnement
porte seulement sur le type de complémentarités : la définition
et la circonscription de chacun des discours en jeu d’une part, à
l’interne donc, la manière de les articuler ou de faire jouer leurs frontières
d’autre part, à l’externe. Pour le dire d’un trait, il me paraît souvent
que les recherches de complémentarités ne poussent pas assez
radicalement la logique de chacun des discours en jeu et que — c’est
lié — la vision d’ensemble proposée au final est trop harmonisante, sa
pertinence et son statut exacts restant au demeurant un peu flous13.
12. Comme exemple récent, citons Jean-Michel MALDAMÉ, Le Christ pour
l’univers. Pour une collaboration entre science et foi, Paris, Desclée, 1998.
13. Notons au passage que si la théologie ou les religions ne sont, ni à même,
ni habilitées à se prononcer sur les structures de la matière et de la vie, leurs
fonctionnements et leurs évolutions, toute détermination à ce niveau et tout
finalisme apparaissent répudiés, comme toute vision, à ce niveau toujours,
d'une « humanisation du cosmos », y compris le « principe anthropique » (cf.
John D. BARROW et Frank J. TIPLER, The Antropic Cosmological Principle,
Oxford, Oxford Univ. Press, 1988 et ID., L’homme et le cosmos. Le principe
anthropique en astrophysique moderne [entretiens avec Marie-Odile
MONCHICOURT], postface de Hubert REEVES, Paris, Imago, 1984), cette
probable « réintroduction de l'anthropocentrisme dans la science », dit Marc
LACHIEZE-REY, op. cit., p. 554 et, plus largement, p. 549-557). En outre, s’il
est vrai que la science ne se prononce pas sur une origine absolue ou en dehors
de l'univers existant et peut reconnaître ce qui est inaccessible, j'aimerais
36 PIERRE GISEL
Au vu de ce que j’ai rappelé au point 2, j’aimerais tout particulièrement
valider, quant à une mise en place d’ensemble, la marque
d’inconnu, de secret ou d’énigme qui est attachée tant aux
« commencements » qu’aux « fins » du monde et de la vie. C’est en
fonction de cet inconnu — dont la face positive ne peut que se penser
comme contingence donnée et reprise sur soi — que se décide l’avènement
de l’humain en vérité. Corrélativement, cet inconnu foncier ne
peut qu’aller de pair avec un monde irréductiblement pluriel, socialement,
culturellement et religieusement ; si le christianisme entend se
proposer comme monothéisme, ce ne saurait dès lors être celui d’un
absolu comme fondement et sanction premiers et derniers de tout ce
qui est, mais celui d’un absolu qui, supposant et réclamant l’autonomie
et la pluralité du monde14, est lié à l’avènement d’une existence
singulière, tout à la fois exposée et traversée tant par une promesse
possible subvertissant la vie et son donné cosmique que par des perversions
propres.
Précisons que dans la perspective d’ensemble proposée, ce n’est pas
seulement une dogmatisation catholique indue et le fondamentalisme
protestant qui doivent être récusés comme « mise en série »15 indue de
ce qu’on peut dire et savoir sur l’état du monde, son évolution, et de ce
que la théologie peut penser sous la catégorie d’« origine » (renvoyant,
classiquement, au « caractère incommunicable de la puissance créatrice
de Dieu »). Doivent aussi à mon sens être critiquées, les visions
qui en appellent à une relation de quasi-partenariat entre Dieu et
l’homme, le Créateur et la créature16, en vue d’une poursuite ou d’un
souligner, contre une certaine apologétique, que l'inaccessible n'est pas ici
tangentiel, mais principiel : il n'y a pas inachèvement, ouverture ou
imperfection, mais discontinuité ou rupture d'ordres.
14. Sur ce point, cf. Le christianisme est-il un monothéisme ? (G. EMERY et
P. GISEL éd.), Genève, Labor et Fides, sous presse.
15. Je suis ici, en profonde consonance, avec Christoph THEOBALD, « La
théologie de la création en question », Recherches de science religieuse,
(1993), p. 613-641.
16. On hérite là d’une conjoncture typiquement moderne des problèmes : la
validation quasi transcendantale, chez Schleiermacher et contre Fichte, d’une
« précédence » du monde et de l’exister sur le sujet, purement conçu comme
acte, cristallise un moment classique de riposte, cf. Le christianisme est-il un
monothéisme ? (G. EMERY et P. GISEL éd.), début de la partie III.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 37
prolongement — voire d’un achèvement — de la création17. Certains
textes de Vatican II n’en sont pas indemnes.
C’est en démarcation de ces théologies modernes ou contemporaines
que j’ai pour ma part toujours souligné l’achèvement de la création,
en son ordre, et la dissymétrie entre ce qui se dit là de
« précédence » ou de surplomb irréductible à l’homme, à son temps et
à son espace, d’une part, et, de l’autre, ce qui s’énonce en termes d’histoire,
d’autonomie ou de liberté. C’est à mon sens là que se jouent la
spécificité et la raison d’être du thème de la création en théologie chrétienne,
irréductible à la thématique du salut, venant s’y articuler dans
la différence ou la contrebalancer, alors que, laissée à elle-même, une
problématique du salut ou ses reprises sécularisées risque de sombrer
dans ses propres perversions anthropocentriques (une relecture de
Nietzsche sera ici de grand profit).
Soulignons enfin que la pluralité indiquée au plan du monde et de
l’histoire humaine ira de pair avec une diversité des instances et des
rationalités qui président aux ordres, différents, que sont le politique,
le civil, le droit ou le moral, comme, justement, le savoir scientifique,
l’expression culturelle et le religieux. Cette diversification des instances
et des espaces évoqués les laisse irréductibles les uns aux autres,
donc autonomes dans leur ordre propre à chaque fois, et même non
« coordonnables » — encore moins intégrables — selon une logique
unique ou selon une homogénéité sociale quelconque, même idéale.
4. Foi et savoir : quelles articulations
et pour quels enjeux ?
Discours religieux d’une part, discours scientifique de l’autre. J’ai
esquissé certains des termes d’une mise en perspective, qui organise leur
prise en compte concomitante. En contrepoint et avant d’aller plus loin,
il convient peut-être de passer brièvement en revue différents modèles
d’articulations proposés et certains des enjeux qui peuvent y être liés.
17. Chez les théologiens, à titre d’exemple : Alexandre GANOCZY, Homme
créateur-Dieu créateur (1976), Paris, Cerf, 1979. On récusera également les
variantes qui, chez Jürgen Moltmann par exemple, proposent, en lien avec
une « périchorèse » trinitaire foncière, une quasi-intégration de l'humain
dans la vie de Dieu et une « inhabitation » de Dieu dans le monde.
38 PIERRE GISEL
Auparavant pourtant, il me paraît nécessaire de faire un peu d’histoire.
C’est que les rapports entre croire et savoir n’ont pas toujours été les
mêmes. Ils forment à chaque fois une conjoncture donnée, située.
4.1 Savoir et croire : brève mise en perspective historique
Ni le savoir ni le croire n’ont toujours été pensés et investis de la même
manière. Leurs limites respectives, comme leur teneur propre — leur
type de rationalité, de déploiement, de validité ou de plausibilité, ce
qu’on en attendait et ce qui pouvait en être reconnu — ont varié. En
outre, savoir et croire font couple. À telle vision — tel statut, telle
organisation et telle limite — du savoir correspond telle vision — possible
ou impossible — du croire.
L’Antiquité chrétienne et le Moyen Âge ont vécu d’une vision du
monde complexe et différenciée, mais synthétique, où le savoir en
appelait à un croire (dans la distinction) et où le croire s’articulait à un
savoir (reconnu dans son indépendance, ne serait-ce qu’au vu de ses
sources non-chrétiennes). Globalement, on a vécu ici d’une vision
(une « métaphysique ») où « substance » et « qualité » sont indissociables
(les choses ont telle ou telle qualité qui les définit), l’ensemble
étant inséré dans une structure cosmique de la « participation » qui
commande la spiritualité d’une origine, d’une fin et d’une raison des
choses, récapitulative et transcendante.
Or, sauf revanches ésotériques, cette synthèse se casse à l’aube des
Temps modernes, sur le plan de la culture reconnue et socialement
opérante. La connaissance se fait à la fois plus expérimentale (active
et pratique) et mathématique (déductive et combinatoire). Le sujet
humain dès lors mis en scène est un sujet libre et créateur, quasi desserti
de l’ensemble organique d’un cosmos intégré, à recevoir, habiter
et contempler. Les formes du savoir sont critiques et dissociatives ;
elles donnent lieu à exaltation et à angoisse.
Aux premiers temps de la modernité occidentale (de la Renaissance
aux Lumières), la science est analytique : elle décompose (cf.
Descartes). La vision globale est celle d’un mécanisme. La physique
n’est plus celle, antérieure, des « qualités » (intrinsèques et greffées
sur les éléments fondamentaux du cosmos, leurs jeux de sympathie et
d’antipathie) et où chaque chose avait son « lieu » (auparavant, la
pierre ne retombe pas sur la terre à cause de propriétés mesurables et
de la loi de la gravitation, mais parce que tel est son lieu d’origine, où
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 39
elle ne peut que revenir et reposer). Le jugement, enfin, est la conclusion
d’une procédure correctement — méthodiquement — menée, et
il va à l’encontre de l’imagination (cf. Spinoza), que l’on renvoie alors
à la superstition, celle qui marque le fond des traditions et des institutions,
dont il faut se libérer.
La nature est ici éprouvée, culturellement et existentiellement,
comme lieu de l’absence de Dieu. Non plus lourde de significations et
de symboles, mais froide, objectivée et soumise à mesure quantitative.
S’il y a un créateur, il est renvoyé au commencement (il a créé le mécanisme
de départ).
En profondeur, et quoi qu’il en soit de certaines modifications au
plan strictement scientifique, nous héritons socio-culturellement de
tout cela (c’est le premier moment de notre modernité, et il demeure
à l’arrière-plan), tout particulièrement en matière de représentation
quant au savoir, donc de place et de forme imparties au croire.
La modernité a vécu d’une idéologie du progrès et de l’idée d’une
substitution, inéluctable et profitable, de la science (seule vraie) à la
religion, aux mythes et aux fables, réputés simplement faux (ainsi
Auguste Comte, fondateur d’une « Église positiviste » et auteur, en
1852, d’un Catéchisme positiviste, fait se succéder, selon une voie de
rationalisation progressive justement, l’âge théologique, l’âge métaphysique
et l’âge scientifique, dernier et définitif).
Aujourd’hui, le positivisme est battu en brèche. Au moins dans sa
forme la plus monolithique et la plus idéologique. C’est que les promesses
de transparence et de libération sociale qui pouvaient lui être
liées, à l’encontre des obscurantismes aliénants, se sont révélées ambivalentes
quand ce n’était pas franchement trompeuses. L’épopée
moderne ne trouve plus en elle-même sa légitimation. Elle doit faire
face à des résistances imprévues (bonnes ou mauvaises), à des complexités
et des pluralités peut-être irréductibles, à des revanches ou des
retours. La modernité doute. Et l’on se prend à parler, çà et là, de postmodernité,
où savoir et croire sont revisités.
40 PIERRE GISEL
4.2 De quelques modèles d’articulation entre science et foi
4.2.1 Conflit entre la science et la foi
D’un côté, on pensera en termes de substitution. De l’erreur (les traditions
religieuses et la foi) à la vérité (les connaissances scientifiques
et les procédures du savoir). De l’autre, en strict vis-à-vis, on estimera
devoir défendre les affirmations religieuses sur le plan même des
représentations et des contenus proposés.
Le Syllabus romain de 1864 (« Recueil renfermant les principales
erreurs de notre temps »), des aspects centraux de Vatican I et la réaction
anti-moderniste (à partir de 1907) chez les catholiques, le néocalvinisme
qui apparaît aux environs de 1880 ou le fondamentalisme
chez les protestants, fournissent de bonnes illustrations de cette attitude.
Dans leurs apparitions comme dans leur logique interne, ils sont
tous, n’en déplaise aux intentions de leurs acteurs, des produits
modernes, nés sur sol moderne et de forme moderne18.
4.2.2 D’une complémentarité entre la science et la foi à un refus d’articulation
En matière de complémentarité, la répartition la plus fréquente est
d’impartir à la science le comment (la description des phénomènes de
la nature et de leurs lois internes) et à la foi ou à la religion le pourquoi
(le sens des mêmes phénomènes). Science et foi sont ici complémentaires
parce qu’elles ne sont pas du même ordre ou ne répondent pas
aux mêmes questions. Chacune, la science comme la foi, a alors une
vue partielle et la complémentarité est possible, mais il ne s’agit pas là
d’une articulation sur fond homogène.
De cette complémentarité sur fond de distinction, on passe facilement
à une séparation plus radicale. On a refusé de mélanger les compétences
ou craint les interférences ; on va dès lors adopter une
attitude qui veut que les scientifiques soient toujours plus scientifiques
et les croyants ou les théologiens toujours plus occupés de la foi et de
sa spécificité (Dieu et son interpellation radicale, sans analogie avec
18. Ce n’est probablement pas par hasard que l’on trouve en général plus de
fondamentalistes parmi les personnes de formation scientifique que parmi les
personnes de formation humaniste classique (littérature, histoire,
philosophie), phénomène également repérable en islam, par exemple.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 41
l’ordre du monde). Du coup, la distinction qui supposait complémentarité
se fait séparation et fonctionne, de fait, comme immunisation.
4.2.3 Modèles de convergence
Des modèles de convergence, il y en a de plusieurs formes. Certains
défendent aujourd’hui un principe dit anthropique (cf. ci-dessus
n. 13). Pour l’essentiel, il consiste à valoriser le fait ou l’impression
que tout l’univers semble être disposé en vue de l’homme et que, sur
ce point, foi chrétienne et données scientifiques peuvent se rejoindre,
en ayant emprunté des chemins différents bien sûr. Il y aurait donc,
inscrite au coeur de l’univers, une intentionnalité secrète.
D’autres — deuxième exemple — présentent un type de convergence
en mettant en avant des analogies entre vision scientifique et
vision religieuse. Ainsi certains auteurs soulignent-ils une affinité
entre les concepts de la physique quantique et le tao (c’est le cas du
physicien Fritjof Capra) ou, plus largement, entre science contemporaine
et religions orientales. On pourrait aussi citer, la « gnose de
Princeton » (Raymond Ruyer), d’il y a environ un quart de siècle.
Dans un contexte et une intention analogues, on assiste encore,
aujourd’hui, à une exploitation des données sur fond d’échec d’un
paradigme matérialiste unidimensionnel, selon lequel le savoir objectif
de la modernité classique viendrait entièrement à bout des réalités
du monde et de l’humain ; d’où une mise en avant de phénomènes spirituels,
parapsychologiques ou paramédicaux.
Enfin, on peut faire référence à la théologie du Process, fort répandue
aux États-Unis, qui, à partir des travaux du philosophe et mathématicien
Alfred North Whitehead (1861-1947), repense la création
en rompant avec tout modèle que surplomberait la notion d’une éternité
immobile, pour inscrire Dieu lui-même dans le devenir (un
« procès ») où il est partie prenante de l’avènement, toujours temporel
ou « actuel », des choses. Là encore, on vise une convergence entre
la science et la foi qui puisse présenter une plausibilité culturelle adaptée
à notre temps.
Indépendamment des questions liées au fait même de vouloir établir
des convergences (la légitimité et la possibilité d’un tel programme),
j’avoue ne pas bien saisir les différences de fond qu’il y
aurait à faire voir les analogies mentionnées ici entre représentations
42 PIERRE GISEL
religieuses et tel aspect de la science contemporaine par rapport aux
tentatives plus anciennes, élaborées à l’enseigne des théodicées
modernes ou des constructions de théologie naturelle. Là aussi, on
entendait jouer sur des analogies entre la religion (chrétienne en
l’occurrence) et les savoirs de l’époque. Les visions proposées
aujourd’hui sont simplement adaptées aux données de notre temps.
On est ainsi passé de l’articulation d’un Dieu créateur, cause extérieure,
foncièrement simple en lui-même (une certaine forme de
monothéisme était alors privilégiée), avec une nature objectivée selon
les paradigmes du rationalisme de la modernité classique à l’articulation
d’un Dieu plus complexe, dont l’action est présente, continue et
diversifiée, avec un cosmos lui aussi plus complexe, traversé d’interactions
et d’interdépendances diverses. Le passage d’une vision à
l’autre est culturellement significatif, mais modifie-t-il la logique de
fond ? ou a-t-on simplement changé de concordisme, parce qu’il fallait
bien s’adapter ?
4.3 Récapitulation
La science d’aujourd’hui souligne l’absence de tout finalisme repérable
sur le plan du déploiement de l’univers et de la vie, de même qu’elle
casse tout anthropocentrisme. Globalement, elle ignore tout ordre de
nécessité préétabli, ne connaissant que des événements survenus sans
raison, mais désormais irréversibles et qui constituent un ensemble
donné, avec ses régulations internes et son ouverture foncière.
Se lancer dans un conflit science/foi — sur le plan des représentations
du monde, de la vie et de l’humain — est une bataille perdue
d’avance, à moins de tomber dans une position sectaire ou autocentrée.
Mais, surtout, c’est se méprendre tant sur ce que sont les données
religieuses que sur ce qu’est la foi, avec ce qui s’y engage du sujet
humain. En outre, c’est ne pas pouvoir répondre de la diversité des
discours religieux.
Passons sur les tentatives de concordisme, voulant établir des similitudes
de même niveau entre ce que peuvent mettre respectivement en
avant la science et la foi religieuse. La critique contre elles me paraît
aisée : focalisation sur des données ou des informations coupées de
leur contexte d’énonciation et de fonctionnement ; sélections scientifiquement
arbitraires et, au demeurant, précaires dans le temps, alors
même qu’on en espérait le contraire ; non-validation, voire refouletheo_
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 43
ment, de ce que peut représenter le fait de la religion et de la foi comme
tel, avec ses problèmes, ses enjeux, ses lois et ses risques propres.
J’ai opté pour une distinction entre la posture humaine que suppose
l’engagement de foi — son type de rapport à soi, au monde et à
Dieu — et les représentations qu’elle propose à chaque fois. Cette
option me paraît commandée par ce qu’est la tradition chrétienne
dans son ensemble, texte biblique compris. La théologie chrétienne ne
part pas — en principe ! — d’une conception ou d’une vision déployée
du monde, de l’homme et de Dieu, pour tenter de les valider face à
d’autres conceptions ou visions ; elle travaille au coeur du présent
social, culturel et religieux qui est le sien à chaque moment de l’histoire.
Et elle est là aux prises avec les questions de tous, pour y inscrire
un type d’interrogation, de problématisation et d’ouverture, qui soit
spécifique certes et instruit par l’histoire qui la précède, mais qui
embraie, dès le départ, sur les données du monde et de l’humain
comme tels, des données problématiques, ouvertes, en débat, voire en
conflit. Or, les questions de l’origine, de l’être et de l’humain sont précisément
des questions qui relèvent de données communes, universelles
en ce sens, inscrites au coeur de l’humain et toujours récurrentes.
La spécification de chacune des perspectives, notamment religieuse
et scientifique, est une autolimitation quant à la portée de
l’angle de vue de chacune (aucune d’entre elles n’épuise à elle seule
l’ensemble du donné). L’existence d’autres perspectives sur le même
objet pour autant qu’elle soit reconnue, empêche un auto-enfermement
et une idéologisation interne. Il est ainsi salutaire, pour la foi et
la théologie, que la science vienne remettre en cause les représentations
qui avaient été les leurs : cela ne peut que les relancer dans
l’interrogation touchant le statut de leurs représentations (le meilleur
des énoncés croyants peut toujours devenir idolâtrique) comme dans
l’approfondissement de ce qui les constitue dans leur vérité propre (le
croire) en lien avec leur objet propre (Dieu ou l’absolu).
Avancer que l’homme doit problématiser le lien noué avec des
représentations du monde et se défaire de faux savoirs ne signifie pas
qu’il puisse vivre sans images. Ce serait faire preuve d’idéalisme.
L’homme se dit dans des mythes et des images, au demeurant non
indifférents ni interchangeables, et dès lors instructifs ; toute constitution
d’identité, personnelle ou collective, se noue au travers d’images,
de récits ou de mythes. Il faut seulement reconnaître que ces
44 PIERRE GISEL
images et visions sont changeantes, inscrites en une culture et une
mémoire à chaque fois, et les faire travailler à ce niveau.
Pour moi, le recours à Dieu n’a pas à fonctionner comme une
explication première et dernière de l’ensemble des choses, de la naissance
du cosmos et de ses lois, ou de l’apparition de l’homme et de son
fonctionnement. Le rapport entre Dieu et le monde n’est pas direct.
D’où notamment une place pour des discours différents, scientifiques
et religieux, et, à l’intérieur de la science, pour une histoire et des controverses,
ainsi que, au sein du religieux, pour des pluralités19. Entre
Dieu et le monde, il y a discontinuité, décalage, asymétrie. Dieu n’est
pas homogène à notre espace et à notre temps. C’est d’ailleurs pourquoi
la foi peut tenir qu’il est présent — et absent — à tous les temps
de l’histoire.
Dieu n’est pas non plus à évoquer comme la raison interne du cosmos
et de la vie ou leur logique secrète. Le rapport entre Dieu et la
création n’est pas fait d’échanges secrets, d’émanation ou de redoublement,
d’homologie, d’embrassement ou de fusion. Le monde n’est
pas de Dieu ni en Dieu : il a sa consistance et son autonomie propres.
À cela correspond une vision du monde ; réciproquement
d’ailleurs. Ce sera celle d’un monde reçu dans sa contingence (le fait
d’être là, sans qu’on puisse en dire la raison), un monde dont l’homme
ne peut faire le tour, un monde qui ne lui est pas entièrement approprié,
même si l’homme se plaît à l’habiter, un monde qui, pour
l’homme, est inséré dans de la démesure, avec son poids d’énigme, de
malheur aussi, et de malheur inexplicable — qu’il n’y a pas à expliquer,
encore moins à justifier.
Quant à l’humain, dans la conscience qu’il a de lui-même —
l’image de lui qu’il peut assumer ou l’identité qu’il peut recevoir et
construire —, il faudra en souligner la différence à l’égard de Dieu
comme à l’égard du monde et du strict biologique, sauf à ce que cet
humain se perde, n’accède pas à soi, à son être. Inscrit en contingence
et partie prenante du monde, l’humain se recevra comme sujet qui
répondra de lui-même en répondant de ce monde hors de la raison qui
19. Notons bien que pluralité religieuse et modifications ou controverses
scientifiques ne sont pas à mettre en parallèle : elles n’ont pas le même statut,
ni ne se pensent et ne s’arbitrent de la même manière.
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 45
le précède et le dépasse. Une tâche ouverte par l’absence de nécessité
soulignée et délimitée par cette absence. L’humain y verra un défi et
une vocation, une difficulté certes (il n’y a ni programme, ni garantie),
mais un surcroît possible aussi : une sorte d’intensification d’être,
dont il n’a pas la maîtrise, mais qui passe par lui et par ce qu’il lui est
donné d’exister. Ici, l’humain est d’une forme et d’une teneur qui, tout
à la fois réclament le donné du monde (son immanence) et le dépassent
selon une autre logique (transcendante).
L’image qu’on peut ainsi se faire du monde et de l’humain impliquera
une défense de l’humain dans sa finitude, ses possibilités et ses
tentations. On saura que la nature ou la vie n’est pas sacrée, ni, en
principe, intouchable ; mais on en usera pour le meilleur, et ici, le
meilleur, c’est celui d’une mesure humaine. On saura qu’il est bon
pour l’homme qu’il reconnaisse qu’il n’est pas maître de tout et qu’il
dépend d’équilibres qu’il ne peut impunément détruire et qu’il est bon
qu’il naisse et se déploie dans la différence, biologiquement, culturellement,
spirituellement.
L’irréductibilité du cosmos à l’humain me paraît devoir être assumée,
tout comme l’irréductible différence entre savoir du monde et foi
religieuse, ainsi que, du coup, l’irréductible pluralité du religieux. Ces
différences sont même requises : elles radicalisent et donnent tout son
poids à l’avènement de l’humain en vérité. Contre toute intégration
totalisante, que ce soit du côté du monde, du cosmos ou de la vie (ou
encore de l’histoire), ou que ce soit du côté du divin.
En tout cela, on tiendra que la vie n’est pas l’humain, ni l’humain
la vie. La vie est, pour l’homme, une condition d’existence, donnée et
fragile, à préserver (non à sacraliser). Quant à l’humain, il en appelle
à d’autres paramètres. Au coeur de la vie, l’humain marque une singularité
où s’articule sa valeur propre. Seul cet humain peut être figure
ou parabole d’absolu, et dans la différence des personnes à chaque
fois. Si la vie est condition à préserver, l’humain est à organiser dans
sa différence propre et dans les infinies particularités qui s'y font jour.
En profondeur, la force et la valeur de l’humain, assumant sa particularité
à chaque fois, seront données en proportion de son ouverture à
ce qu’il n’est pas : le monde ou la nature, le biologique, d’autres
manières d’être homme, l’absolu bien sûr ; hors de cela, l’organisation
de l’humain se fait sourdement totalitaire.
46 PIERRE GISEL
5. Quel statut pour la théologie ?
La foi et la théologie sont liées à la tradition d’une manière de se poser
dans l’être. C’est que le religieux, fait de matrices symboliques et de
données socio-culturelles larges, se cristallise dans des religions historiques
(elles vont de pair avec des formes de civilisations). Cette tradition
est constamment traversée d’acculturation et de recomposition,
et l’on peut donc dire qu’elle est en condition d’odyssée. Liées à une
tradition, la foi et la théologie ont ainsi part à un phénomène socioculturel
d’institutionnalisation, avec ses frontières et ses marges
(l’apocryphe, l’ésotérique, etc.), ses divers types aussi (l’Église, la secte
et la mystique, pour reprendre Weber et Troeltsch), ainsi qu’à des partitions,
elles aussi socioculturelles et changeantes, où se spécifient le
croire, le savoir, la morale ou l’esthétique et où s’organise un ordre
social global.
La foi et la théologie ne peuvent dès lors se limiter à une défense
ou une réinterprétation d’énoncés confessés (un dieu, une forme de
médiation, de ritualité, etc.) ou d’événements allégués (via des histoires
symboliquement organisées). La théologie doit, greffée sur le mouvement
de tradition qu’on vient d’évoquer — une tradition comprise
comme la prise en charge de données globalement humaines et prenant
toujours à nouveau corps dans un socioculturel particulier —, se
faire critique et réflexive. Tout en s’inscrivant dans la culture et les
quêtes spirituelles du temps (ce qu’elle a fait au coeur de l’Antiquité
tardive, moment classique de sa constitution à proprement parler, à
distance et en différence du moment qu’elle se reconnaît ou se construit
comme référence, le moment biblique), la théologie ne cessera de
développer en même temps une réflexion attachée au statut de la
vérité dont elle entend rendre compte et raison (elle y a pourvu au
coeur de la même Antiquité tardive via un moment qu’on dira ensuite
de théologie négative, greffé sur ses affirmations et ses positivités, permettant
de les approfondir, « spirituellement », et d’éviter qu’elles ne
soient occasion d’idolâtrie). Cette vérité s’inscrit en outre délibérément
dans le cadre d’une problématique communément partagée
(pour en rester au moment classique de l’Antiquité tardive, celle de la
question du divin, de son rapport à l’être ou de son statut d’au-delà de
l’être, celle des systèmes de médiations et d’intermédiaires, etc.) et
non, comme cela a commencé à l’être avec le début des Temps modernes,
en catholicisme comme en protestantisme, l’attachement à une
LA THÉOLOGIE FACE AUX CHANGEMENTS... 47
« révélation », légitimant et accréditant une institution spécifique, de
type ecclésial.
Globalement, je tiens dès lors que la théologie comme discipline a
pour lieu et objet, d’un côté, la symbolisation du monde, de l'existence
humaine et de l'espace social, et, de l’autre, le rapport à
l'absolu20. Tel me paraît être en effet la double face de l’ordre humain
des croyances. La théologie y est assignée et s’y déploie comme une
discipline qui réfléchit, selon un axe propre, aux productions idéologiques
liées aux institutionnalisations humaines, leurs symboliques
organisationnelles (assurant des jeux de normativité) et leurs mises en
place de références ou d’idéaux en matière de légitimation (passant
par constructions de l’imaginaire). J’ajoute qu’en modernité, une telle
perspective conduit à passer par une histoire des diverses relations qui
se sont nouées entre l’Église comme institutionnalisation du religieux
(« hérésies » ou autres contrepoints inclus) et la société comme espace
socioculturel, présidant à des circonscriptions déterminées à chaque
fois, des instances de légitimité et des types de rationalité reconnus.
Cette histoire se fera dès lors généalogie de la modernité et du destin
du religieux en modernité (sécularisation, ersatz idéologiques, nouveaux
mouvements religieux, recompositions, etc.), s’efforçant d’y
proposer des orientations claires quant à leur limites de validité et
quant à leur forces et à leurs faiblesses possibles (les secondes sont
toujours le revers des premières) et de pertinence globale (non réservée
à un groupe spécifique, fût-il ouvert, ni aux adhérents d’un message
à transmettre, reçu de l’extérieur, dût-il concerner tout le
monde). Pour qu’elles soient de pertinence globale, il aura fallu
qu’elles soient, dès le départ et constitutivement, la prise en charge —
spécifiée bien sûr — d’une question de tous. Par rapport à une certaine
manière de comprendre la foi et la théologie, c’est peut-être là aussi
une odyssée ; elle me paraît faire cohérence avec ce que j’ai esquissé à
l’occasion des rapports entre savoir et foi à propos des commencements
(de l’origine ?) et des structurations (de l’être ?) du monde.
20. Pour plus de développement, je me permets de renvoyer à mon ouvrage,
La théologie face aux sciences religieuses. Différences et interactions, Genève,
Labor et Fides, 1999.
48 PIERRE GISEL
RÉSUMÉ
La présente contribution cherche à saisir l’impact des changements de
représentations du cosmos sur la théologie. Après avoir rappelé certaines
données scientifiques et présenter un aperçu des données bibliques et
chrétiennes en la matière, l’auteur fait une proposition de balisage
théologique au regard de la non-homogénéité ou des contradictions qui se
dégagent de la confrontation de la science et de la Bible. Il fait alors un
retour sur les types d'articulation possibles entre le savoir scientifique et le
fait de croire. Il présente enfin un aperçu touchant la question du statut de
la théologie.
ABSTRACT
The present contribution seeks to grasp the impact of the change in our
representation of the cosmos. The author first recalls some of the scientific
data and presents an overview of the christian and biblical data on the
subject. He also proposes reference points to guide the way of theology
while taking into account the lack of homogeneity and the contradictions
that appear when scientific and biblical data are confronted. He then looks
at different possible ways of articulating scientific knowledge and faith. He
finally gives an outline concerning the status of theology