quarta-feira, 13 de julho de 2022

A semântica e a natureza da Diaconia - Aula 1

 

Prof. Nelson Célio de Mesquita Rocha

Aula nº 1

 

A semântica e a natureza da Diaconia

Marcos 10.35-45

E aproximaram-se dele Tiago e João, filhos de Zebedeu, dizendo: Mestre,
queremos que nos faças o que pedirmos.
E ele lhes disse: Que quereis que vos faça?
E eles lhe disseram: Concede-nos que, na tua glória, nos assentemos,
um à tua direita, e outro à tua esquerda.
Mas Jesus lhes disse: Não sabeis o que pedis; podeis vós beber o cálice
que eu bebo e ser batizados com o batismo com que eu sou batizado?
E eles lhe disseram: Podemos. Jesus, porém, disse-lhes: Em verdade vós
bebereis o cálice que eu beber e sereis batizados com o batismo com que
eu sou batizado,
mas o assentar-se à minha direita ou à minha esquerda não me pertence
a mim concedê-lo, mas isso é para aqueles a quem está reservado.
E os dez, tendo ouvido isso, começaram a indignar-se contra Tiago e João.
Mas Jesus, chamando-os a si, disse-lhes: Sabeis que os que julgam ser
príncipes das gentes delas se assenhoreiam, e os seus grandes usam de
autoridade sobre elas;
mas entre vós não será assim; antes, qualquer que, entre vós, quiser
ser grande será vosso serviçal.
E qualquer que, dentre vós, quiser ser o primeiro será servo de todos.
Porque o Filho do Homem também não veio para ser servido,
mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos.

 

         O termo “diaconia” tem sido tradicionalmente associado a uma atividade secundária da Igreja.[1] Isso se dá em virtude de se ter associado a missão da Igreja à proclamação do Evangelho, cuja tarefa tem um cunho espiritual, que se resume apenas ao discurso. Assim, espiritualizando-se essa missão, relega-se o ministério da Diaconia da Igreja para segundo plano.

   Sobre “diaconia” tem-se pensado também numa associação simplesmente a assistencialismo. Uma atividade que tem o objetivo de atender apenas aos conflitos sociais e manter um certo status quo eclesial.

    Mais uma associação, referente ao termo “diaconia”, tem sido evocado: a sua identificação com prestação de serviços por parte de instituições de caridade, com o envolvimento de famílias e comunidades. Nesse caso, esses grupos sociais delegam o cuidado por seus membros necessitados a instituições especializadas, a profissionais competentes. Isso é denominado de “terceirização da caridade”.[2] Sendo desta forma, no espírito neoliberal, individualizam-se os problemas e as soluções.

     Uma vez que muitos não têm entendido o tema “diaconia” ou têm compreensões contrárias ao que ensina a Bíblia, há, portanto, a necessidade de se aceitar e compreender que a “diaconia” emerge como disciplina teológica, buscando seu espaço, sua fundamentação teológica e sua conceituação.

        A “diaconia” se apresenta com seu caráter interdisciplinar, como espaço de uma ciência teológica, imprescindível para a busca da fundamentação teológica e da conceituação contextualizada.

        Sobre o texto neotestamentário acima citado, como se pode compreender a “diaconia”?

 Perguntas fundamentais sobre o texto (Mc 10.35-45):

        1.    O que não é “diaconia” segundo a ação dos discípulos?

2.    Qual a confusão que estava em seus pensamentos?

3.    Qual o corretivo de Jesus acerca do sentido de “diaconia”?

4.    A quem é dirigido o ensino de Jesus?

Mateus 25.31-46

                 31. E, quando o Filho do Homem vier em sua glória, e todos os santos anjos,

              com ele, então, se assentará no trono da sua glória;

         32. e todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros,

              como o pastor aparta dos bodes as ovelhas.

         33. E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda.

         34. Então, dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu

              Pai, possuí por herança o Reino que vos está preparado desde a fundação

              do mundo;

         35. porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber;

              era estrangeiro, e hospedastes-me;

         36. estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão,

              e fostes ver-me.

         37. Então, os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com

              fome e te demos de comer? Ou com sede e te demos de beber?

         38. E, quando te vimos estrangeiro e te hospedamos? Ou nu e te vestimos?

         39. E, quando te vimos enfermo ou na prisão e fomos ver-te?

         40. E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que, quando o

              fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.

         41. Então, dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim,

              malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos;

         42. porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me

              destes de beber;

         43. sendo estrangeiro, não me recolhestes; estando nu, não me vestistes;

              e estando enfermo e na prisão, não me visitastes.

         44. Então, eles também lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos

              com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou nu, ou enfermo, ou na

              prisão e não te servimos?

         45. Então, lhes responderá, dizendo: Em verdade vos digo que, quando a

              um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim.

         46. E irão estes para o tormento eterno, mas os justos, para a vida eterna.

 

Perguntas fundamentais sobre o texto (Mt 25.31-46):

        1.    Que ligação tem este com o texto anterior sobre a “diaconia”?

2.    Qual será o critério de julgamento do Senhor na sua vinda?

Análise da palavra “diaconia”

               Diaconia deriva-se do grego diakonia, -as, h - Significa: distribuição de comida, socorro; serviço; ministério, administração, ministração.

       ■     A palavra diakonew significa: sou servo de, sirvo à mesa, ofereço comida e bebida a; sirvo, exerço o diaconato.

          Na língua grega, a mesma palavra é usada para indicar os homens ou as mulheres que ocupam esse ministério da ação social.

            A Igreja é uma comunidade de serviço, pois serve a Deus.[3] Foi instituída para servir a Deus no serviço ao ser humano. A Igreja foi estabelecida na Pedra Fundamental que é Jesus Cristo:

             Pois também eu te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as                     portas do inferno não prevalecerão contra ela.

      E eu te darei as chaves do Reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado nos              céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus.[4]

               “Tu és Pedro” – pétros: fragmento de pedra; pedra pequena.

  ■     “... e sobre esta pedra” – pétra: pedra grande; grande rocha.

  ■     “Edificarei a minha Igreja” – ekklesían.

  ■     “... e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”.

      A Igreja é a comunidade que serve como paradigma para as demais instituições humanas; ela é a primeira a se mostrar diante do mundo. A sua importância é tão notória, que Deus a utilizou para elaborar a Escritura Sagrada e ao mesmo tempo conservá-la, bem como disseminá-la em todo o contexto da existência humana. A Igreja é responsável pelo exercício da fé, porque ninguém exerce fé solitária e nem pode viver sem prestar serviço dentro da comunidade . Há de convir que existem aspectos inevitáveis sobre a realidade da Igreja: o pessoal e o institucional. A Igreja é comunhão de pessoas; é uma organização; é uma realidade histórica.

Virtudes e práticas da Igreja como Comunidade Diaconal, segundo Romanos 12.9-21[5]

       A Igreja é o Corpo de Cristo. É composta de todos os remidos pelo sangue do Cordeiro. Logo, deve a Igreja agir condignamente, através da sua própria razão e natureza, de ser e de existir no mundo, com suas virtudes e práticas, fundamentadas na Palavra de Deus.

A Igreja forma o povo de Deus na terra e tem por objetivo edificar a vida das pessoas de todos os lugares e de todos os tempos, sendo instrumento de Deus.

O texto bíblico da Epístola de Paulo aos Romanos, apresenta o quadro de uma Igreja que deve desenvolver as virtudes e práticas ensinadas por Deus em sua Palavra.
Há qualidades que o povo de Deus deve trazer em seu bojo, obedecendo aos parâmetros da única regra de fé e prática que é a sacrossanta Palavra de Deus, e portanto, causará, sem dúvidas, impacto profundo na sociedade.


O apóstolo Paulo ao registrar a Sabedoria do Espírito Santo, veementemente expõe com precisão “Qualidades do caráter da Igreja”, para que a mesma possa crescer em graça diante de Deus e dos homens.

 

     Vejamos o que é necessário, segundo o ensino bíblico, para que a Igreja cresça e se torne uma bênção para o Reino de Deus:

1.   A PRÁTICA DO AMOR SEM HIPOCRISIA (9, 10). Deus não quer um amor falso e hipócrita. O amor deve ser praticado em favor do próximo, do contrário Deus não pode aceitar qualquer ato, mesmo que seja em nome do amor.

2. O APEGO AO BEM REPUDIANDO O MAL (9). É preciso detestar o mal sob quaisquer pretextos. O contrário da prática cotidiana é o apego ao bem, que é Deus e sua Palavra.

3.  O FERVOR ESPIRITUAL NO SERVIÇO DO SENHOR (11). Nós não devemos ser remissos (relaxados) no serviço do Senhor, pois ele fez tudo para tivéssemos o melhor: a salvação, “Fervor espiritual” é o zelo que temos para como o serviço de Deus.                                        

4.    A PRÁTICA DA ESPERANÇA COM ALEGRIA (12). “Regozijai-vos na esperança” é a ordem da Palavra de Deus. Deus não quer que tenhamos uma esperança em reclamação, duvidando do seu poder.

5.    O EXERCÍCIO DA PACIÊNCIA NA TRIBULAÇÃO (12). Às vezes é difícil suportar as tribulações, mas é preciso confiar na graça divina. O Senhor é quem nos dá o escape. As tribulações não são maiores que o Senhor Deus.

6.    A PRÁTICA DA ORAÇÃO PERSEVERANTE (12). É preciso orar sempre e nunca esmorecer. Muito pode a oração do justo.

7.    A ASSISTÊNCIA SOCIAL E A HOSPITALIDADE (13). “Compartilhar a necessidade dos santos” é poder ajudar as pessoas que precisam. A hospitalidade é o acolhimento que os santos dão às pessoas que passam por dificuldades.

8.   A PRÁTICA DE ABENÇOAR E NÃO AMALDIÇOAR (14). É muito fácil dizer palavras ruins quando alguém nos perturba. Logo, procuramos xingar ao invés de entrega nas mãos de Deus as nossas palavras.

9.    A INTERAÇÃO E A SIMPATIA COM OS QUE SOFREM (15). “Alegrar-se com os que se alegram e chorar com os que choram”, faz parte da missão do Filho de Deus, quando esteve entre as pessoas.

10. O EXERCÍCIO DA HUMILDADE (16). Ser humilde é viver como Jesus viveu. É preciso considerar o valor que os outros têm, reconhecendo as suas virtudes, pois todos são importantes.

11. O VIVER EM PAZ COM TODAS AS PESSOAS (18). A Paz é um dos grandes temas do Reino de Deus. Faz parte do projeto de Jesus Cristo. “Se possível, quanto depender de vós...” Todo o esforço para a paz.

12. A AUSÊNCIA DE VINGANÇA (19, 20). Deus é Deus de justiça, por isso nada de vingança. A vingança é a paga do mal pelo mal.

13. TRIUNFAR SOBRE O MAL ATRAVÉS DO BEM (21). O mal não tem mais força que o Sumo Bem que é Deus, o nosso amigo. Onde abundou o pecado, superabundou a graça de Deus.

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[1] Cf. NETO, Rodolfo Gaede. A Diaconia de Jesus: uma contribuição para a fundamentação teológica da diaconia na América Latina. São Leopoldo: Sinodal: Centro de Estudos Bíblicos; São Paulo: Paulus Editora, pp. 9-12.

[2] Cf. Ibid.

[3] ROCHA, Nelson Célio de M. Igreja: Comunidade de Serviço. Monografia do Curso de Bacharel em Teologia. Rio de Janeiro, pp. 55 ss.

[4] Mateus 16.18-19, SBB, ERC.

[5] ROCHA, Nelson Célio de Mesquita. Virtudes e práticas da Igreja de Cristo. Cordeiro, RJ, 27 de novembro de 1994. Adaptações feitas em Rio de Janeiro, 05.02.2003. O Título inicial era “Qualidades do Caráter da Igreja”.