terça-feira, 12 de julho de 2022

ORDEM POLÍTICA E ORDEM MORAL - PARTE 2

 

3.      Fundamento ético da ordem política

3.1.Pressuposto fundamentais

Primeiro – É de natureza teológica e se refere à afirmação sobre a essência não meramente escatológica do Reino de Deus, presente já no mistério. Existe uma relação que não é de mera identidade, nem de pura diferença, mas a expressão de uma tensão dialética entre a presença e a ausência da santidade e da justiça divina, também entre as contradições e oposições da história humana. 

Segundo – É de natureza ética e propõe como fundamento ético o justanaturalismo clássico, conforme o qual a razão moral nunca pode vir subordinada à razão política. A ordem política tem um fundamento ético, dado que a ação da liberdade histórica deve ser iluminada pela consciência moral. Portanto, a Igreja deve procurar com o ministério da Palavra, iluminar simultaneamente as consciências e robustecer a vontade no exercício histórico da liberdade. Ainda, a ação da Igreja interessa diretamente a consciência moral; contudo, indiretamente pode chegar até a esfera política, mudando progressivamente a realidade social.

Terceiro -É de caráter epistemológico e considera o pluralismo dos modelos e paradigmas, que procuram configurar a estrutura da realidade social. A Igreja, enquanto comunidade de fé, procura antes denunciar os erros e as contradições do ponto de vista da justiça, para depois propor princípios que possam melhorar a configuração das instituições políticas do ponto de vista ético.

3.2.Princípios ético-políticos 

O Estado deve procurar o bem comum sem prejudicar os direitos fundamentais dos indivíduos.

Princípios que devem ser salientados:

a) O primado da pessoa humana em ordem aos fins. Reconhecer na esfera do direito a dignidade da pessoa humana, que na esfera da religião é reconhecida também como imagem de Deus.

b) A afirmação do bem comum como valor do Estado, negando o Estado autocrático, no qual de fato são incentivados privilégios e desigualdades. Sob essa ideia se pensa o conjunto de condições que permitem aos indivíduos, famílias e instituições sociais de chegar à própria perfeição.

c) A importância da participação de todos na vida política, como assunção ciente e livre da própria responsabilidade no conjunto do processo político social, econômico e cultural. Somente desta maneira se pode permitir a superação da alienação política em todas as suas dimensões.

4.      Alguns corolários e pressuposições críticas

4.1.Crítica teológica das ideologias

Uma crítica é feita, principalmente, quando se trata de sistemas totalitários, sejam eles da filosofia marxista, da ideologia da segurança nacional e do liberalismo tecnocrático.

          O progresso não deve ser procurado exclusivamente na esfera econômica do aumento da produção, mas no melhoramento da distribuição do lucro e, sobretudo, na ordem política, social e cultural, para uma melhor participação em todos estes níveis.

          Se requer, portanto, um sistema político no qual exista uma verdadeira participação de todos os cidadãos, a tutela jurídica dos seus direitos, a promoção das instituições intermediárias, o equilíbrio dos poderes do Estado e uma justa representação política de todos.

4.2.O estado democrático como ideal político

A ideia democrática se concretiza na história por meio da liberdade política. Pode-se considerar o foco na visão teônoma,[2] possibilitando uma antropologia teológica centrada no homem enquanto imagem de Deus.

          A dignidade humana não é, portanto, uma mera indicação orientativa, mas um verdadeiro imperativo moral, ao qual deve ser subordinada à mesma razão política. Assim, a ideia do bem comum traz consigo a construção do Estado de Direito. É preciso haver um trabalho educativo das consciências, repletos dos imperativos morais da justiça os quais devem ser sempre considerados, para poder procurar o melhor progresso social, particularmente dos mais marginalizados.

          A ideia democrática se encarna na sociedade pelo agir da vontade responsável, respeitosa particularmente da liberdade e dignidade dos outros. Assim, é fundamental que haja a passagem do Estado autocrático para o Estado democrático, que tem como função o bem comum, do exercício do direito de cidadania e de todos os trabalhadores.        

          A participação de todos é importante no reformismo social, através de movimentos. Isto deve ser constantemente procurado.

Conclusão

Algumas tomadas de decisão da ação da Igreja na sociedade:

1.      A Igreja deve lutar contra as diversas formas de totalitarismo. 

2.      A ação da Igreja tem de ser crítica, denunciando profeticamente as injustiças.

3.      A Igreja, com sua mensagem, convoca a todos à instauração de uma nova ordem social inspirada pela justiça, solidariedade e paz, dada à íntima relação que existe entre a história e o Reino de Deus, já que o Cristo é simultaneamente presença do Reino e Senhor da história.

4.      A Igreja, enquanto instrumento de reparação da natureza caída, esforçar-se para que os direitos naturais sejam conhecidos e reconhecidos.

5.      A participação de todos, com respeito e liberdade política.

6.      A única alternativa: o Estado Democrático de Direito, formar a consciência política em cada cidadão.

7.      Exigências comunitárias e reformismo social na gestão política, com urgência, precisam ser pautas principais da dinâmica da Igreja.

Rev. Nelson Celio de Mesquita Rocha




[1] Este texto é fundamentado em anotações da obra de PASTOR, Félix Alexandre. O Reino e a História. Problemas teóricos de uma teologia da práxis. Fé e Realidade, Loyola: São Paulo. 1982, pp 113-128.

[2] Cf. TILLICH, Paul. Teologia Sistemática. 5ª Ed. Rev., pp. 68, 97-99, 157-159, 216, 247, 611, 660, 691-708, 711, 712, 713, 714. O autor propõe o conceito de “Teonomia” em lugar dos conceitos de “Autonomia e Heteronomia”.