quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Graça gratificada ou graça gratuita?

Próximos dias 30 e 31 de agosto de 2010. Av Vicente de Carvalho, 1083 - Vila da Penha - FAECAD - 19h00.

Introdução

Qual é o significado de púlpito hoje nas igrejas cristãs do Brasil e do mundo? O que a Sagrada Palavra ensina sobre a pregação? Quem pode pregar a Palavra de Deus? É correto cobrar numerário em troca de pregação?
Estas perguntas precisam ser respondidas no contexto de nossa existência, pois a pregação da mensagem divina está comprometida por algumas formas estranhas à Palavra de Deus. É bem verdade que existe uma boa parte de vocacionados por Deus, que não se entregaram e nem se entregam às facetas de um desdobramento pernicioso que circunda e pulula no meio protestante atual. Existe gente comprometida com Deus e com o seu reino, mas é necessário falar sobre esse lado vergonhoso que vamos relatar neste simpósio de Teologia na FAECAD – Faculdade Evangélica das Assembléias de Deus no Brasil, da CGADB.
Este simpósio de teologia nasceu no coração reflexivo da turma do segundo período da manhã, com aprovação do Diretor e também do Coordenador do Curso de Bacharel em Teologia reconhecido pelo Ministério da Educação e Cultura do Brasil. Entende-se que é fruto do ensino sério do corpo docente que a Instituição possui e de estudantes que não querem mais ver nenhum laivo de miséria espiritual e intelectual neste País chamado Brasil, a nossa pátria querida.
Vamos, então, sem delongas, ao primeiro ponto em relação ao tema - “Púlpito: um local de comércio?” – Graça gratificada ou graça gratuita?

1. A questão da pregação somente pela remuneração pré-estabelecida

Antes de qualquer coisa relacionada à pregação, é necessário refletirmos sobre alguns pontos que têm relação direta com o discurso salvífico e edificador. Discurso este, que vem do coração de Deus para o coração das pessoas. Assim, é preciso que se tenha um conceito correto do que é a igreja, a pregação e a graça de Deus.

1.1. A natureza e o propósito da Igreja
A Igreja é o Povo de Deus através da experiência de gratuidade; de ser o povo eleito; de viver a comunhão com o próprio Deus, com a humanidade e com o cosmos.
Compreende-se melhor a Igreja quando se pode examinar a origem do termo igreja, bem como a sua própria natureza.
A Bíblia, em tempo algum, faz uso da palavra igreja relacionada a um prédio, denominação, ou ainda a influência cristã na sociedade. O termo grego para igreja no Novo Testamento é ekklesia, é usado para designar o novo povo de Deus. No grego secular a palavra ekklesia não tem sentido religioso. Na LXX é considerado um termo técnico para significar no hebraico o QAHAL YHWH, a “Congregação do Senhor”. Este termo, tirado do mundo, é muito significativo, pois indica um chamamento dos cidadãos, em Cristo, de dentro do mundo, para se reunirem diante do Senhor. As expressões EKKLESIA TOU THEOU (Igreja de Deus) ou EKKLESIA TOU CHRISTOU (Igreja de Cristo), revela o significado da verdadeira Igreja.
EKKLESIA é constituída da raiz do verbo KALÉO (chamar). Logo, a Igreja é mais do que uma agregação de pessoas, porém uma congregação. É mais do que uma organização, uma denominação, é o povo de Deus.
Há outra palavra no Novo Testamento, derivada da LXX que é SYNAGOGE, que se origina de SYN + AGO, que significa “chegarem juntos” ou “estar reunidos juntos”. Esta palavra é exclusiva para denotar as reuniões dos judeus no aspecto religioso (sinagoga). O povo de Deus é aquele que está junto, e que caminha junto, numa mesma direção.
Quem fundou a Igreja? Esta é uma pergunta feita pela exegese bíblica. É considerada uma problemática para alguns estudiosos. Mas, em que sentido se fala em fundação da Igreja? Em que sentido Jesus Cristo fundou a Igreja?
Através da origem se manifesta a essência da Igreja. Pode-se considerar que a Igreja foi pensada a partir de uma caminhada histórica. É o mais importante projeto de comunidade desenvolvido pelos seguidores de Jesus Cristo.
Jesus se encontrava com as pessoas e estabelecia uma relação com elas. Depois, com a morte do Senhor há uma ruptura nessa relação, mas é restabelecida na ressurreição. Os discípulos dão testemunho a respeito do Senhor ressurreto (Atos 2.24,32).
A Igreja é o verdadeiro modelo da ordem de Deus neste mundo. A comunidade petrina entendeu o verdadeiro sentido da Igreja:

“Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia” (1 Pedro 2.9-10).

Vejamos os significados de alguns termos importantes para compreensão da eclesiologia petrina, retirados do texto neotestamentário:
“Raça Eleita” - significa que Deus elegeu um povo para proclamar a Sua graça. Essa eleição foi a decisão divina numa perspectiva eterna. Foi a experiência da gratuidade divina. Deus salva por graça e não por méritos de alguém. Os méritos são os de Cristo Jesus, o Filho Unigênito de Deus.
“Sacerdócio Real” - A Igreja é sacerdotal, porque Cristo é o Sumo Sacerdote. É a tarefa do antigo Israel no Sinai, de ser uma nação sacerdotal aos gentios (Êxodo 19.6). A Igreja é o sacerdócio instituído pelo próprio Deus, a fim de que a humanidade tenha acesso ao Seu Reino e possa oferecer-lhe dádivas aceitáveis. A Igreja é sacerdotal quando aponta à humanidade o propósito de Deus em Cristo Jesus, que é o melhor projeto de vida já elaborado.
“Nação Santa” - Santa, quer dizer “separada”. A Igreja é de Deus. Santa, não quer dizer isolada do mundo, mas que deve viver a articulação: Igreja, Reino de Deus e Mundo. Santa, porque é de Deus e não de homens (possessão). A Igreja foi tirada do mundo para proclamar a Palavra de Deus aos homens e as mulheres.
A Igreja é a Comunidade dos santos; daqueles que crêem e que são santificados em Cristo, e que estão unidos com Ele, numa dimensão relacional com o Ressurreto que se desdobra na fraternidade tão exigida pela Sagrada Escritura, principalmente o Novo Testamento, a partir das próprias palavras do Messias em João 17.
Na perspectiva de Lucas a Igreja é definida como a comunidade que crê e cujo coração é um (Atos 4.32). Em Efésios, consta “um só corpo, um só espírito, assim como foram chamados em uma só esperança” (Efésios 4.4).
A Igreja na Patrística apresentava duas faces: mistérica e institucional.
A partir destas duas faces a Igreja vivia. Na face mistérica a Igreja se expressava como a comunidade de salvação. Ela celebrava a fé, começando pela Palavra, que não foi vivida de forma individualista, mas em sentido comunitário, dentro da congregação dos fiéis. A mesma fé caracterizava a vida da Igreja. Na Ceia do Senhor, a fé determina a Igreja em sua trajetória (EKKLESIA - 1 Coríntios 11.18; 20.33). Na fé tem-se a semente da Igreja. A fé é o primeiro momento da Igreja. A Igreja transforma a Palavra em ação. Quem acolhe a Palavra tem de transmiti-la. A essência é viver cada momento. O apóstolo Paulo utiliza muito essa palavra (Efésios 5.21-32). A Igreja é o Corpo de Cristo: aliança amorosa. Paulo chega a fazer esta profunda declaração: “Grande é esse mistério.”
Na face institucional, a Igreja era minoritária; era uma Igreja nova. Era bem diferente do judaísmo e dos cultos pagãos. Características: alegria, expansão missionária e muito dinamismo. Era o povo de Deus um “pequeno rebanho” que vivia o amor, a compaixão, a solidariedade e a misericórdia. Tudo isso, em contraste com o mundo de poder e autoridade não condizentes com a vontade de Deus.

1.2. A natureza e o propósito da pregação
A pregação é a arte de proclamar a Palavra de Deus. É a tarefa primordial da Igreja e de mais nenhuma sociedade humana, porque ela foi eleita e designada para tal serviço.
A palavra “pregação” é derivada do latim praedicatio, que por seu turno traduz o grego kerygma, palavra esta que, em seu sentido mais geral, significa a proclamação de um fato ou de um acontecimento. É situada regularmente no Novo Testamento para descrever a mensagem e a atividade dos evangelistas cristãos, os quais tinham “boas novas” supremas para contar, boas novas de que, em Cristo, Deus visitou e redimiu o seu povo e que a salvação estava sendo oferecida gratuitamente a todos quantos se arrependessem e pusessem sua confiança nele. Os pregadores eram os arautos do Reino de Deus.
A prédica cristã teve início na Palestina. Seus primeiros pregadores e auditórios, sua formação e afinidades espirituais eram judaicos. Era, pois, muito natural e necessário que a maneira de se pregar seguisse o padrão dos profetas do Antigo Testamento e do ensino rabínico.
A prédica cristã alcançou um progresso, disseminando a mensagem do Evangelho por toda parte. A prédica ganhou auditório maior mais favorável. Os elementos primordiais do discurso foram as maneiras provadas de convencer e persuadir os mortais, e nas mãos de homens piedosos como Basílio, Gregório, Crisóstomo, Ambrósio e Agostinho.
O objetivo do pregador é convencer o ânimo, despertar a imaginação, mover o sentimento e impelir poderosamente a vontade na direção daquilo que a verdade exige. Há certos fatos a respeito de processos e funções da mente humana que dão existência a princípios de tratamento. Importa bem mais que o pregador aprenda esses princípios ao invés de servilmente decorar e obedecer a umas tantas regras. Haverá ocasião, no que respeita a regra sem se quebrar este ou aqueles princípios. Circunstâncias diversas, a individualidade do pregador, a ocasião, bem como a espécie de auditório, tudo isso faz com que as regras fiquem no seu lugar de servos, e não de senhores, para que as formas sempre sejam flexíveis e variáveis.
A melhor qualidade de um sermão não é o fato dele ser bastante homilético, mas o de mover e comover as vidas para aceitarem o Reino de Deus e sua justiça; para a realização maior do serviço da Igreja de Jesus Cristo.

1.3. A semântica e a natureza da graça de Deus
A palavra “graça” nem sempre se usa na Escritura com o mesmo sentido, senão com uma variedade de significados. No Antigo Testamento temos a palavra chen (adjetivo chanun), da raiz chanan. O nome pode denotar plenitude de graça ou de beleza, Provérbios 22.11; 31.30; pelo que, em geral, na maior parte significa favor ou boa vontade. O Antigo Testamento fala repetidas vezes de achar o homem favor aos olhos de Deus. A benevolência, assim encontrada, traz consigo a concessão de graças ou bênçãos. Isto significa que a graça não é uma qualidade abstrata, senão bem mais ativa, um princípio operante que se manifesta em atos de benevolência, Gênesis 6.8; 19.19; 33.15; Êxodo 33.12; 34.9; 1 Samuel 1.18; 27.5; Ester 2.7. A idéia fundamental é que as bênçãos concedidas por graça são as que se proporcionam em forma gratuita, e não em consideração a algum direito ou mérito.
A palavra do Novo Testamento charis, de chairein, “regozijar-se”, denota antes toda uma agradável aparência externa, “amabilidade”, “agrado”, “aceitação”, e esse significado encontra-se em Lucas 4.22; Colossenses 4.6. Não obstante, um significado mais notável da palavra é o de favor ou boa vontade, Lucas 1.30; 2.40, 52; Atos 2.47; 7.46; 24.27; 25.9. Pode denotar a bondade ou benevolência por Deus, 2 Coríntios 9.8 (referindo-se a bênçãos materiais); 1 Pedro 5.10. Ademais, a palavra expressa a emoção despertada no coração daquele que recebe um favor tão grande, e desta maneira adquire o significado de “gratidão” ou “agradecimento”, Lucas 4.22; 1 Coríntios 10.30; 15.57; 2 Coríntios 2.14; 8.16; 1 Timóteo 1.12.
Não obstante, na maior parte das passagens em que a palavra charis é usada no Novo Testamento, significa a operação imerecida de Deus no coração do homem, efetuada mediante a ação do Espírito Santo.
Quando algumas vezes falamos de graça como uma qualidade inerente, é na realidade a comunicação ativa das bênçãos divinas mediante o trabalho interno do Espírito Santo procedentes da plenitude dAquele que está “pleno de graça e de verdade”, Romanos 3.24; 5.2, 15, 17, 20; 6.1; 1 Coríntios 1.4; 2 Coríntios 6.1; 8.9; Efésios 1.7; 2.5, 8; 3.7; 1 Pedro 3.7; 5.12.
A “graça” é um atributo de Deus, uma de suas perfeições divinas. É o imerecido favor ou amor de Deus, amor gratuito e soberano para o homem em seu estado de pecado e culpa, que se manifesta no perdão do pecado e na libertação da pena merecida. Está relacionada com a misericórdia de Deus tal como se distingue de sua justiça. Esta é a graça redentora no sentido mais fundamental da palavra.

2. Exploração do rebanho ou sustento do obreiro?

A ausência de uma consciência solidificada na Palavra de Deus conduz pessoas a uma falsa confusão de papéis na existência. Quando não se sabe ser o que se deve ser, pode ser aquilo que nunca deveria ter sido. E, hoje, por falta de uma consciência genuína na Palavra de Deus, há muitas expressões que jamais deveriam existir, e que só comprometem negativamente o Reino de Deus.
A fim que não haja uma exploração da emoção e da fé de pessoas, principalmente das mais simples, vejamos os papéis da igreja, do obreiro e do pastor.

2.1. O papel da Igreja como Povo de Deus
A missão da verdadeira Igreja de Cristo Jesus é mais do que proceder caridosamente. É participar da reconstrução do mundo, como Jesus procedeu. É reintegrar de modo pleno o homem no Reino de Deus. Não utilizar somente a Palavra como teoria, mas na prática mostrar a operosidade que procede de Deus. “MENOS CARIDADE E MAIS JUSTIÇA”, escreveu alguém no muro de uma rua de uma certa cidade. A Igreja precisa estar atenta às carências das pessoas, e oferecer-lhes o conforto de que tanto precisam.
Em Lucas 24.49 está registrada uma ordem de Jesus dada aos seus discípulos para que permanecessem na cidade de Jerusalém. Mas, essa permanência seria por pouco tempo e não definitivamente. Eles não deveriam ficar acomodados, observando os acontecimentos sem uma ação dinâmica. Até quando deveriam permanecer em Jerusalém? “Até que sejais revestidos de poder (dínamis) do alto”.
É lamentável que pessoas não entendam as palavras do Senhor, e permaneçam dentro de si mesmas, ou de suas paredes, ainda, das quatro paredes de um templo, a fim de não cumprirem a vontade de Jesus Cristo, como se de fato fosse assim mesmo: adoração sem compromisso com a missão de fazer discípulos de todas as nações.
O Espírito Santo foi enviado para capacitar a Igreja; dar-lhe poder para realizar a missão confiada: de ir por toda parte e proclamar as boas novas de salvação a todas as pessoas. Jesus prometeu enviar o Espírito: “da minha parte, eu vou enviar-vos o que meu Pai prometeu.”
A Igreja quando entende a sua missão acomodada na história, não se caracteriza e se realiza como povo de Deus. Assim a Igreja que desejamos é aquela que descortina novos horizontes e encarna na existência humana o projeto de Jesus Cristo.
Em Atos 2.1-13, ao cumprir-se o Dia de Pentecostes, Deus enviou o Seu Espírito para dinamizar a Sua Igreja. A promessa feita foi cumprida, porque o Deus que promete é o Deus que cumpre. Deus é fiel ao cumprimento de Sua Palavra. Ela não pode falhar.
No Antigo Testamento a palavra “ruah” é traduzida por vento, sopro, força de vida (Êxodo 15.8-10; Isaias 11.4; 40.7; Gênesis 2.7). Força misteriosa é a força de YHWH. O Espírito de Deus é força de vida e criação (Gênesis 2.6; 6.2,17; 7.15,22). O Espírito como força psíquica operante (Juízes 13.25; 14.6; 14.19; 15.14, 3.10; 6.34; 11.29; 1 Samuel 11.6). Nestes textos constam que, homens realizaram obras extraordinárias, alcançaram vitórias inesperadas, sob o impacto do Espírito de Deus.
O Espírito de Deus se comunicava constantemente ao povo através dos profetas (Zacarias 7.12; Isaías 48.16). O Espírito de Deus inspira transformação.
No Novo Testamento, o Espírito Santo é força, dínamis. É mais pessoal; é “alguém”. Nos evangelhos sinóticos, a exceção de Mateus 28.19, nenhuma dessas escrituras apresenta o Espírito Santo como pessoa, mas como força. Am Atos, o Espírito de Deus é concebido como força. A Igreja nasce por ocasião do Pentecostes. O Espírito de Deus dá coragem, força aos pregadores do Evangelho.
Não poderia ter havido um dia tão especial como foi o Dia de Pentecostes, para que a Igreja pudesse provar do dínamis de Deus, e apresentar os primeiros frutos: três mil batizados, após ouvirem o discurso de Pedro (Atos 2.14-41).
Quem que recebe o dínamis de Deus, não o recebe para conforto de si mesmo, mas para realizar a vontade de Deus. Viver no Espírito é viver uma maneira nova. É uma nova criação que responde com um “sim responsável”.
A Igreja que desejamos é a Igreja que vive a liberdade do Espírito de Deus, sempre preparada para obedecer a todos os imperativos de Jesus em favor dos oprimidos e marginalizados pelo pecado que, a cada dia, execra a vida humana. Assim, torna-se operoso o que recebe a graça de Deus, sendo obediente dentro do Corpo de Cristo.

2.2. O papel do obreiro como servo e não como explorador
Um dado interessante no contexto do Reino de Deus, tendo a Igreja como Corpo de Cristo, é que todos que fazem parte do seu corpo são obreiros; todos são servos. Logo, o papel do obreiro é o de servir e não de se aproveitar das pessoas. Todos são livres para servir.
Mas existem pelos menos três formas de se usar a liberdade. É o que vemos no Evangelho de Lucas capítulo 10 versos 25 a 37, onde Lucas narra a parábola do bom samaritano.
A condição atesta que o homem é um ser independente e dependente, ele é livre. Deus o criou livre. Livre para amar, para raciocinar, para servir e para relacionar-se. Ser livre é bom. Podemos decidir ir e vir. Liberdade é algo maravilhoso. Porém há uma realidade latente no homem que é uma realidade voltada para o mal. Quando as pessoas decidem fazer o mal elas causam escravidão, tornando a vida das pessoas mais debilitadas.
No texto de Lucas o intérprete da lei está preocupado em utilizar sua liberdade, a qual está condicionada apenas à prática de decorar alguns mandamentos da lei. A liberdade naquele momento era pôr Jesus à prova. Decorar a lei é muito fácil, mas viver o espírito da Palavra é mais difícil. É muito mais ação do que teoria. Jesus disse que sua liberdade não era apenas decorar a lei, mas sim observar a própria dinâmica da lei. O intérprete da lei faz outra pergunta a Jesus: “Quem é o meu próximo?”
Diante desta pergunta é que a palavra de Deus ensina acerca das três formas de se utilizar a liberdade:
1. Uma grande parcela das pessoas utiliza a liberdade contra os outros - Os salteadores utilizaram a sua liberdade contra o homem, deixando-o semimorto, à beira do caminho. Quando nós utilizamos a liberdade que Deus nos deu, contra os outros, nós vamos contra Deus, contra nós mesmos e contra a criação. O homem tem uma tendência para fazer o mal. Quando toca na sua ferida, suas palavras e seus atos se voltam para o mal. Este primeiro uso da liberdade é detestável segundo a Palavra de Deus.
A verdadeira religião é a religião do amor; devemos pregar a paz e não a violência. O homem quer converter outros através da violência, mas a verdadeira conversão é pelo amor, pela Palavra de Deus. O cristianismo tem que ser profético e não agressivo. Por isso é que nós não podemos nos calar, porque ser cristão é ser seguidor de Cristo, é servir a Deus Pai, Filho e Espírito Santo, pois é Ele que dá a vida; Deus não é violento. Quando Deus entregou seu Filho Cristo Jesus à morte disse um não a ela, mediante a ressurreição. Deus é contra a violência, a sua Palavra diz que Ele é amor.
Devemos ter atitudes contrárias à dos salteadores; devemos ter cuidado com a forma como usamos nossa liberdade.
2. Outra parcela de pessoas usa da liberdade em causa própria - O texto nos mostra a atitude do sacerdote e do levita. Essas pessoas foram colocadas por Deus em seus cargos para cuidar do próximo, mas eles resolveram fazer o contrário, “passaram de largo”, fugindo assim de sua responsabilidade.
Nós devemos ter cuidado, pois ser líder dá status. Ser pastor, presbítero, diácono ou mesmo ocupar qualquer cargo na igreja, que isto não “suba à nossa cabeça”, porque perante Deus somos todos iguais. Não existe ninguém maior, ou melhor, que os outros. Se existe alguém exercendo um cargo importante é para que esta pessoa sirva a Deus e aos outros e não, servir-se. Devemos ter cuidado com as expressões “eu posso”, “eu faço” ... Pois, quando se perde o temor de Deus, usam-se os dons e talentos em causa própria.
Deus nos outorga dons para que sejamos melhores pessoas, melhores famílias, melhores igrejas; para que assim, possamos transformar o mundo. Nossos dons não são para prevalecermos diante da sociedade. Quando servimos é aí que nos tornamos grandes. Este segundo uso, Deus também não aceita. Nunca devemos perder o temor de Deus, pois quando o perdemos, passamos a fazer a nossa vontade.
3. O terceiro uso da liberdade é o que Deus quer, que é justamente para fazer o bem - Como Cristo, nós devemos servir. Jesus veio para servir. Teve uma vida de serviço. Como Ele, devemos servir em favor dos outros; devemos acolher os outros. Estar sempre dispostos a ouvir o outro, amar o outro. A convivência fraterna nos ajuda a ver a vida como ela tem de ser.
Tipificado na pessoa do samaritano, Jesus trata daquele homem ferido. É aquele homem ferido que nos representa. Nos representa em relação às nossas necessidades, às nossas angústias e depressões. É naquele momento que Jesus nos acolhe. Nosso exemplo é Cristo. Podemos ver na Sua Palavra que Deus é um Deus que nos acolhe.
O Senhor nos deixou aqui o exemplo, para que usemos da liberdade para servir, para ajudar os outros. Onde começa isto? Na nossa família, na nossa Igreja, no nosso trabalho, no nosso condomínio. Nós vivemos para servir a Deus e aos nossos irmãos.

2.3. O pregador da igreja local e o pregador convidado
O pregador de uma igreja local pode ser o pastor ou o que ele designar para tal nobre função. O pastor de uma igreja local é o docente, pois tem a responsabilidade de ensinar a Palavra de Deus, porque para isso, foi-lhe dada essa missão. E, pregar e ensinar a Palavra tem de ser com sabedoria e prudência.
Pregar com sabedoria é retirar da divina palavra a genuína mensagem que salva e edifica o rebanho. Daí o estudo aprofundado sob oração. É necessário que o pregador retire da Palavra apenas o que ela quer dizer e não o que o pregador ache o que ela deva dizer ou supõe dizer. Fazendo assim, o rebanho se nutrirá da boa alimentação do Senhor.
Mas, também é preciso que o pastor da igreja local se alimente em primeiro lugar, da Palavra Fiel, a fim de que o rebanho veja o seu exemplo.
É de bom alvitre que a Igreja ouça também outros pregadores, uma vez que a diversidade enriquece, e também porque Deus fala e usa outras pessoas para transmitir a mensagem de vida que está em Cristo Jesus, o Senhor. Assim, todo esse exercício espiritual acontece de forma dinâmica, e refletindo a vida que Jesus Cristo veio trazer.
O culto do Senhor é o encontro de Deus com seu povo. É no culto que a igreja mostra a sua verdadeira natureza. Ela adora ao Deus vivo e verdadeiro e recebe a sua Palavra de esperança para uma caminhada melhor. Logo, não há barganha no culto, mas liberdade para adorar e haver edificação.
Quando um outro pregador convidado, o que seja autorizado para pregar, vier de longe, é justo que a igreja local cubra as suas despesas. Mas é injusto e ímpio o ato de cobrar por uma pregação. Isto se confunde com comércio na casa de Deus.

3. Ostentação de vaidades ou dignidade salarial do obreiro?

Aqueles que foram comissionados para pregar a Palavra de Deus e cuidar do rebanho, não devem ostentar nisso quaisquer vaidades, pois é tarefa que envolve zelo e alta responsabilidade. Por isso é preciso atentar para a vida e para o sustento digno do obreiro de Deus.

3.1. A vida moral e espiritual do pregador
O solo onde medra a pregação poderosa é a própria vida do pregador. Essa é a grande questão que faz a arte da pregação ser diferente de todas as demais artes de comunicação.
As Escrituras ensinam que surgem ocasiões em que aparecem em cena homens dotados de notáveis dons ministeriais, mas que são destituídos de uma vida condizente com o próprio ensino bíblico. A Bíblia não esconde as más obras das pessoas. A história da Igreja também registra os feitos de indivíduos que foram soberanamente usados por Deus, no exercício dos dons ministeriais, e que a despeito disso, mostraram não ser possuidores da graça santificadora. Assim, o pregador tem de cuidar de sua vida devocional e espiritual, a fim de que possa ser sempre um instrumento vivo nas mãos de Deus.
A vida de um ministro é a vida de seu ministério. Se a pregação, em última análise, é a transmissão da verdade por meio de algum instrumento humano, então a verdade particular que é transmitida tem o seu efeito incrementado ou diminuído pela vida através da qual ela se expressa.
Onde se encontra o segredo de uma pregação operosa? Encontra-se, antes de tudo, não no conteúdo bem elaborado exegética e homileticamente, mas na vida do pregador. O pregador tem de viver uma vida de profunda comunhão com Deus, a fim de que a verdade que ele transmite, torne-se uma força viva em vidas que o Senhor colocar à sua disposição para receber o seu ensino.
É muito importante atentar para a seguinte observação: Quanto mais o pregador for conhecido por sua gente, haverá de aumentar ou diminuir a sua influência, de conformidade com a qualidade de sua vida diária (Cf. os textos bíblicos: 1 Ts 1.4-5; 2.10, 13; Tt 2.7; 1 Tm 3.1-7; 4.16. Estes textos, por enquanto, ajudam a refletir neste momento).

3.2. A pregação e a vida e a vida e a pregação
Uma das mais perturbadoras descobertas feitas na vida de pregadores é o fato de que pouquíssimos têm hábitos devocionais pessoais e sistemáticos. Alguns pregadores pensam que o estudo pode substituir a vida devocional. No entanto, é fundamental ter uma vida de oração e de estudo da Bíblia, não somente com o intuito de preparar algum estudo ou mensagem, mas de aprender da Palavra de Deus.
Aprender a Palavra de Deus, colocando seu ensino em primeiro lugar na vida. Porque como alguém pode transmitir a outro o que não coloca em prática? Seria motivo de surpresa que o ministério de tais pessoas fosse assinalado pelo desequilíbrio na área doutrinária? Seria motivo de admiração que prevalecesse tão grande frieza no coração desses pregadores? Não é de admirar que haja tão pouca íntima e perscrutadora aplicação das Escrituras, quando a grande maioria dos pregadores contemporâneos admite que eles não se deixem expor sistematicamente ao Livro de Deus, com o propósito de obterem ali a iluminação pessoal e a santificação.
Nenhum pregador tem o direito de pregar, simplesmente porque possui o dom de analisar textos e a capacidade de explicá-los ao longo de sua exposição. Se a Palavra que ele prega a outras pessoas, antes de tudo não serviu de instrumento para seu próprio doutrinamento e para a sua própria santificação, ele não está capacitado a anunciá-la a outras pessoas. Essa é a função da Palavra de Deus na vida do pregador, e essa função sempre deve ocupar o primeiro lugar.
É fundamental e urgente que, nestes tempos de tantas ambigüidades e confusão entre o que se vive e o que se prega, em alguns lugares e ocasiões, despontem pessoas que saibam viver e pregar a Palavra de Deus.

3.3. O respeito devido ao que foi vocacionado por Deus
Parece que há hoje uma crise de falta de respeito. Talvez, porque quem deveria agir com respeito, seja primeiro quem não o exerça. O que faz uma pessoa ser respeitada? Será o dinheiro, a posição ou o caráter?
Para algumas pessoas o dinheiro é a base do respeito, porque quem tem mais pode mandar mais; pode querer mais; pode impor mais.
Outras pessoas acham que posição social impõe respeito. Pode-se pensar que posição social se derive do acúmulo de dinheiro; ou do acúmulo de dinheiro à atitude de respeito.
A história de vida de algumas pessoas está repleta de casos nefastos, tanto nas que têm dinheiro em grande acúmulo, quanto nas pessoas que ocupam grandes cargos na sociedade. Pessoas que se tornaram padrões de violência e de decadência, nos scripts da vida civil e da vida religiosa. Ocorrem escândalos a cada momento da corrida do cronômetro. O crhonos não pára.
Mas o que é verdadeiro e necessário refletir sobre o respeito, é o desenvolvimento do caráter, que faz uma pessoa boa ou má. Se o caráter for edificado na ordem do bem, certamente a pessoa será vista como uma pessoa de bom caráter; do contrário, mau caráter. Assim, é importante agir com equilíbrio, demonstrando sempre aquilo que somos, a partir de uma base concreta.
Uma pessoa vocacionada por Deus para exercer o sagrado ministério da Palavra, tem seu caráter moldado pela Palavra de Deus. A Palavra de Deus é a base ético-moral da vida do pregador. Sendo assim, pode-se reconhecer naturalmente sua vocação que, implicitamente, desdobra-se no cotidiano, e por si só, imprime respeito das testemunhas.
O respeito devido ao pregador é o reconhecimento de sua competência pelas pessoas da igreja, que não maltratam homens e mulheres com suas vocações; nem estes exploram as vidas que Deus lhes confiara.

Conclusão

Graça gratificada ou graça gratuita? É esta a questão proposta, quando se trata do púlpito, que simboliza a pregação cristã.
Ensina Jesus em sua Palavra: “Digno é o trabalhador do seu salário” (Lc 10.7).
Ninguém vive de vento; ninguém vive de mágica. Todos precisamos atender às necessidades mais básicas de nossa vida. Mas, isso não dá o direito de explorar a fé das pessoas, e, acima de tudo: explorar em nome de Deus.
Tem muita gente que irá dar contas a Deus no último dia. Tem muita gente que vai arder no mármore do inferno, junto com o diabo. Porque estão usando o nome de Deus em vão. Assim, está mais do que na hora, de ensinar o que é certo; o que é verdadeiro; o que é respeitável. Se alguém quer ganhar o seu sustento que trabalhe e não use as coisas de Deus para esse fim.
Tem pessoas que não conseguiram ser alguma coisa na vida, e descobriram que ser pastor é o caminho. Logo, se enveredam pelo caminho daquilo que não foram comissionados. Irão até certo ponto no tempo, mas o fim chegará, e será drástico.
Pregar a Palavra de Deus é um privilégio e ao mesmo tempo uma grande responsabilidade. Não é para qualquer pessoa, mas para quem Deus chama e prepara.
Se o obreiro foi chamado por Deus, o seu sustento não faltará, porém não o deixará rico.
O obreiro vocacionado não vive ostentando vaidades, mas carrega em seu bojo, a humildade cristã que caracterizou a vida e a obra de Jesus Cristo.

Nelson Célio de Mesquita Rocha

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